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Channel: Eternas Músicas
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Eu Sou Terrível

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Eu Sou Terrível
Roberto Carlos e Erasmo Carlos
1967

"Eu Sou Terrível"é uma canção composta por Roberto Carlos e Erasmo Carlos, em 1967. Faixa inicial da trilha sonora do seu primeiro filme, "Roberto Carlos Em Ritmo de Aventura", "Eu Sou Terrível" foi uma das últimas canções finalizadas para o repertório do longa-metragem. 

Pouco antes do lançamento do disco de Erasmo Carlos, depois de mais de um ano de separação, Roberto Carlos mandou um mensageiro levar uma fita de rolo para o antigo parceiro. Surpreso, Erasmo Carlos colocou a fita para rodar e reconheceu a voz de Roberto Carlos"Oi, bicho, como vai? Olha, eu não estou mais zangado com você, não. Eu já te desculpei!", disse Roberto na introdução da mensagem.

Erasmo se surpreendeu com a iniciativa de Roberto. Mas Roberto Carlos não queria apenas reatar a amizade com Erasmo. Buscava também retomar a parceria, e lhe fez um pedido na fita.

"Eu comecei a fazer uma música aqui que pede um tipo de letra que você faz em dez minutos. Nesta música eu quero dizer que eu sou um cara terrível, que dirijo em disparada e que as mulheres me adoram. Faz essa letra pra mim porque eu quero incluir no filme que estou fazendo."

Naquele momento, Roberto Carlos estava fechando o repertório da trilha de seu primeiro filme,"Roberto Carlos em Ritmo de Aventura", que o diretor Roberto Farias já tinha começado a rodar. E o último tema que faltava era exatamente uma canção de ritmo pulsante e agressivo que daria o tom do filme.

Envolvido com filmagens, shows, gravações, Roberto não conseguia concluir a música e decidiu recorrer ao ex-parceiro. Na fita enviada, ele tocava a melodia no violão, cantando apenas fragmentos da letra:
"Eu sou terrível / e é bom parar / parapapá / parapapá..."

Conforme previsto por Roberto, Erasmo Carlos fez aquela letra com facilidade, embora tenha demorado bem mais do que dez minutos. E assim nasceu outro grande sucesso dos anos 60: "Eu Sou Terrível", canção que marcou o recomeço da parceria RobertoErasmo.

Eles voltaram com a corda toda, pois a partir daí iriam compor grandes canções como "Se Você Pensa", "Sentado à Beira do Caminho", "As Curvas da Estrada de Santos", "Sua Estupidez", "Jesus Cristo". Pode-se dizer que "Eu Sou Terrível" marcou o recomeço e também o fim de uma fase na parceria da dupla, pois foi a última composição estilo Jovem Guarda. As canções seguintes já iriam revelar outras influências, notadamente a Soul Music, marcante nos discos de Roberto Carlos até o início da década de 1970.



Eu Sou Terrível

Eu sou terrível e é bom parar,
de desse jeito me provocar.
Você não sabe de onde eu venho,
o que eu sou e o que tenho.
Eu sou terrível, vou lhe dizer,
que ponho mesmo pra derreter.

Estou com a razão no que digo.
Não tenho medo nem do perigo.
Minha caranga é máquina quente.
Eu sou terrível e é bom parar,
porque agora vou decolar.
Não é preciso nem avião,
eu vôo mesmo aqui no chão.

Eu sou terrível, vou lhe contar,
não vai ser mole me acompanhar.
Garota que andar do meu lado,
vai ver que eu ando mesmo apressado.
Minha caranga é máquina quente.
Eu sou terrível, eu sou terrível

Eu sou terrível e é bom parar,
de desse jeito me provocar.
Você não sabe de onde eu venho,
o que eu sou e o que tenho.
Eu sou terrível, vou lhe dizer,
que ponho mesmo pra derreter.

Estou com a razão no que digo.
Não tenho medo nem do perigo.
Minha caranga é máquina quente.
Eu sou terrível, Eu sou terrível

Eu sou terrível.


Samba em Prelúdio

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Samba em Prelúdio
Baden Powell e Vinícius de Moraes
1962

A música "Samba em Prelúdio" surgiu durante um encontro entre Baden Powell e Vinícius de Moraes. Esta é uma engraçada história contada pelo violonista Baden Powell, um dos maiores músicos do Brasil das décadas de 60 e 70, sobre a composição da música "Samba em Prelúdio", cuja letra Vinícius de Moraes fez.

O jeito leve e descontraído de ser de Baden Powell pode ser visto já numa das anedotas em que se envolveu. Certa vez, o músico chegou ao Teatro Record, em São Paulo, de sandálias e calças brancas direto do Rio Janeiro. Requisitado a ir para o hotel se trocar antes da apresentação, não quis. "Aqui você não vai cantar", disseram-no, e ele voltou imediatamente de taxi para a Cidade Maravilhosa.

Pena para os paulistanos que perderam na ocasião a oportunidade de ouvir música e histórias dessa grande personalidade. Em "Samba em Prelúdio"Baden Powell chamou Vinícius de Moraes, a quem considerava "mais que um pai", para ouvir a música que compusera.

Romântica e bela, a canção encontrou-se digna de uma letra de Vinícius de Moraes. Sentados à mesa com whisky e violão, iniciaram a empreitada criativa. Na terceira garrafa da bebida, enquanto a letra não saía, Vinícius de Moraes, constrangido, disse achar que a música era plagiada de Frédéric Chopin, ao que Baden Powell respondeu: "Você que bebeu demais e está implicando comigo!".

Quem resolveu o imbróglio foi Lucinha, então mulher de Vinícius de Moraes, acordada às 3:00 hs da madrugada, já que era pianista e fã de Frédéric Chopin, para descobrir se a música tinha ou não sido copiada de uma obra do compositor polaco do século XIX.

Ao constatar que as notas realmente eram originais de Baden PowellVinícius de Moraes ficou sem graça e disse: "Então, Baden, Chopin esqueceu de fazer essa".

Questão solucionada, Vinícius de Moraes pôde, finalmente, sentar-se à máquina de escrever e de uma vez fazer a letra inteira da música "Samba em Prelúdio".


A história contada na íntegra por Baden Powell:
"Vinícius de Moraes foi mais que um pai pra mim. Foi um amigo que ficou inesquecível no coração da gente. Nós vinhamos muitas vezes aqui para Petrópolis acabar de compor as músicas, e numa dessas vindas eu cheguei na casa do Vinícius e falei assim:
- Olha Poetinha, eu fiz uma música e acho que essa música tem um negócio muito bom, e ela é uma música bem apaixonante, ela é cheia de amor e tal.
Eu toquei a música pra ele. Ele gostou, falou:
- Mas que música... vai dar uma letra de amor muito bonita!
Então pra começar nós arrumamos a mesa, botamos aquela garrafinha de whisky, o violão. Ficamos nós três ali, o violão, eu e Vinícius... e a garrafa também (risos). Nesta época nós enxugávamos bem uma garrafinha de whisky.
Quando foi lá pras tantas, três horas da manhã, nós estávamos já na terceira garrafa e eu cheguei perto do Vinícius e falei assim:
- Oh Vinícius, tá tudo bem, nós já estamos, acho, quase bêbados não é? E a letra do samba até agora não saiu não é Vinícius?
Ele falou assim:
- Não Baden, sabe o que é que é? Aconteceu uma coisa aqui e eu não quero te contar não. mas eu... eu vou deixar essa letra pra lá. Eu não vou fazer essa letra mais hoje não!
- Mas o que é que houve Vinícius?
- Não houve nada não, coisas...
- Não, mais agora você vai pois afinal de contas Vinícius, eu cheguei aqui nove horas da noite e n ós já tocamos essa música, já estamos na terceira garrafa e você vem dizer que não dá?
- Não, não... é uma coisa muito desagradável , depois eu falo!
- Não, nós estamos em quatro paredes, eu, você e tal... não tem mais ninguém, conversa de amigos, então conta o que aconteceu, o que é que houve?
- Não Baden, é uma coisa desagradável, não queria te falar, mas... o que acontece é o seguinte: Eu acho que essa música é plágio!
- Plágio? Porque você não me disse antes? Eu não tinha tocado tantas vezes até agora!
- É plágio Baden e depois não vai ficar bem, vai sair nos jornais: 'Baden e Viníciius plageiam'
Eu falei assim:
- Não Vinícius, tudo bem, essa música não é plágio, mas diga: Plágio de quem?
- Isso é claro Baden, isso aí é Chopin!
- Não Vinícius, eu conheço Chopin. Conheço os Prelúdios Noturnos de Chopin e não tem nada a ver com Chopin.
- Isso é Chopin, você não me engana, eu tenho ouvido Baden. Você não me engana, isso é Chopin. Você bebeu demais, talvez e tal... fez uma música e pensou que era sua e não é... você tava fazendo uma música de Chopin!
- Eu falei assim:
- Não Vinícius, eu acho que quem bebeu demais foi você. Você está implicando comigo!
Sabe quando a pessoa bebe demais, acende o cigarro do lado contrário, não amarra o sapato... aquelas coisas!
- Então eu vou acabar com essa dúvida. Eu vou chamar a minha mulher, a Lucinha, e ela vai te dizer se é plágio ou não, porque o compositor preferido dela e Chopin e ela toca piano, tem curso e tal!
- Não Vinícius, não vai acordar ela, são três horas da manhã... nós bebemos qualquer coisa né? Acordar ela agora? A gente tá com esse bafo de onça Vinícius... não tá direito!
- Não... não... não... não se incomode não! Ela já está acostumada!
Aí ele foi lá acordar. Ela veio na sala e disse:
- Boa noite! Vocês querem um café com leite?
Eu disse:
- Não... não... não mistura não... se não vai piorar a situação! (risos)
Aí o Vinícius disse:
- Toca a música Baden!
Eu toquei, toquei, toquei.
- Toca de novo!
Eu toquei.

Ela ficou olhando e disse:
- Afinal de contas essa música é uma beleza, é muito bonita, uma música romântica.
Aí o Vinícius ficou olhando assim pra ela falou:
- E você não diz nada?
- Nada o que Vinícius?
- Isso aí é Chopin!
- Não Vinícius. Isso aí não é Chopin, eu conheço as coisas de Chopin!
Aí o Vinícius ficou se graça e falou pra ela assim:
- Até você tá contra mim?
- Mas ninguém está contra você!
Aí ele ficou sem graça, ficou olhando e disse:
- Quer dizer que não é Chopin não, não é?
Aí ele chegou olhou pra mim e disse assim:
- Então Baden, Chopin esqueceu de fazer essa!
Aí ele foi pra máquina de escrever e de uma só vez, nunca mais esqueci, ele escreveu esta letra por inteiro!


(Baden Powell)



Samba em Prelúdio

Eu sem você
não tenho porquê
Porque sem você
não sei nem chorar
Sou chama sem luz
jardim sem luar
Luar sem amor
amor sem se dar

Eu sem você
sou só desamor
Um barco sem mar
um campo sem flor
Tristeza que vai
tristeza que vem
Sem você, meu amor
eu não sou ninguém

Ah, que saudade
que vontade de ver renascer nossa vida
Volta, querido
meus abraços precisam dos teus
teus abraços precisam dos meus
Estou tão sozinho
Tenho os olhos cansados de olhar para o além
Vem ver a vida

Sem você, meu amor
eu não sou ninguém
Sem você, meu amor
eu não sou ninguém

Maringá

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Maringá
Joubert de Carvalho
1932

Engana-se quem acha que a canção "Maringá" foi composta em homenagem a cidade Maringá no Paraná. Basta ouvir a letra da música que logo se vê que a cidade referenciada é Pombal na Paraíba e não Maringá no Paraná.

A canção "Maringá" foi composta por Joubert de Carvalho a pedido do então Senador Ruy Carneiro que em Pombal, PB encontrou-se com Maria do Ingá, linda cabocla que vinha em retirada fugindo da seca. A mesma seca que a separou do Senador.

Sabendo da história Joubert de Carvalho compôs a música para o amigo Ruy Carneiro e tronou-se um hino da cidade de Pombal. Ela nada tem a ver com a bela Maringá no Paraná.

Quando "Maringá" foi composta, os paraibanos logo passaram a entoá-la ante o seu sucesso. Mais tarde, fugindo também da seca, paraibanos migraram para o Paraná para trabalhar numa fazenda e durante a lida cantavam a canção "Maringá". Depois essa fazenda tronou-se vila e cidade, hoje Maringá, PR. Nome dado a cidade em razão da canção que tanto era cantada naquela fazenda.

A História da Música Maringá
Texto gentilmente cedido por Teófilo Júnior

Cidade de Pombal, Paraíba, década de 20. Uma família de retirantes arruma seus poucos pertences em um pau de arara e um jovem casal se despede. Ela, bonita, deixaria a cidade junto com a miserável família para tentar uma vida melhor em São Paulo. Era a família de Maria, da cabocla Maria do Ingá.

Ele, um jovem mais triste ainda. Sem dinheiro não tinha condições de embarcar no caminhão. Todas as economias daquela família eram mínimas para a longa viagem, não haveria mais espaço para um corpo franzino e muito menos para mais uma boca.

O pau de arara parte deixando no ar o último toque de mãos entre Maria e o namorado. Ele corre atrás do caminhão, armazenando todo o fôlego possível, até desistir em meio a poeira.

Não há registros sobre o nome do caboclo que ficou. João Ninguém? Talvez.

Num bar próximo, um grupo de amigos assistia a cena. Comovidos, chegaram a recolher moedas perdidas nos bolsos, mas poucos réis não seria suficientes para cobrir os gastos da viagem ou para conformar o coração daqueles jovens separados pela miséria.

Eles conheciam Maria. Ela morava numa região conhecida como Ingá, nas margens do Rio Piranhas. Daí o seu nome: Maria do Ingá!

Moça prendada, desde os 12 anos já preparava pratos típicos. Com um sorriso encantador, era a alegria da centenária cidade paraibana até o dia do adeus parado no tempo.

A homenagem, porém, ficaria para o amigo Ruy Carneiro, ilustre filho da cidade de Pombal, também na Paraíba. Foi ele mesmo que teria contado para Joubert de Carvalho, durante conversa em um bar no centro do Rio de Janeiro, a triste história de uma cabocla chamada Maria do Ingá.

Joubert de Carvalho ficou emocionado com o relato sobre a família de retirantes e do desespero do namorado de Maria, deixado em Pombal.

Mas seria tudo aquilo verdade ou lenda? Ruy Carneiro, então, revelou: Era ele um dos rapazes que estava no bar, uma das testemunhas do adeus.

Provavelmente, foi o próprio amigo de Joubert de Carvalho quem batizou a triste moça de Maria do Ingá, também inspirado na lenda de uma cabocla conhecida com este nome, vítima da terrível seca de 1877.

Convencido, Joubert de Carvalho partiu para o escritório a fim de terminar a composição. Varou a madrugada compondo a toada. O refrão estava pronto:

"Maria do Ingá, Maria do Ingá
Depois que tu partiste
tudo aqui ficou tão triste
que eu fiquei a imaginar"

Não, não estava bom!

"Maringá, Maringá
Depois que tu partiste
tudo aqui ficou tão triste
que eu fiquei a imaginar"

Foi o último retoque, a obra-prima estava pronta!



Maringá

Foi numa leva
que a cabocla Maringá
Ficou sendo a retirante
que mais dava o que falar

E junto dela
veio alguém que suplicou
Pra que nunca se esquecesse
de um caboclo que ficou

Maringá, Maringá
Depois que tu partiste
tudo aqui ficou tão triste
que eu garrei a imaginar

Maringá, Maringá
Para haver felicidade
é preciso que a saudade
vá batê noutro lugar

Maringá, Maringá
volta aqui pro meu sertão
Pra de novo o coração
de um caboclo assossegar

Antigamente
uma alegria sem igual
dominava aquela gente
da cidade de Pombal

Mas veio a seca
e toda chuva foi-se embora
Só restando então as águas
dos meus olhos quando chora

Maringá, Maringá
Depois que tu partiste
tudo aqui ficou tão triste,
que eu garrei a imaginar

Maringá, Maringá
Para haver felicidade
é preciso que a saudade
vá bater noutro lugar

Maringá, Maringá
volta aqui pro meu sertão
Pra de novo o coração
de um caboclo assossegar


Drão

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Drão
Gilberto Gil
1981

Gilberto Gil escreveu a música em 1981, poucos dias depois de sua separação com Sandra Gadelha. A letra é uma parábola sobre o amor, que não morre - e sim, se transforma. Assim como o trigo, ele nasce, vive e renasce de outra forma. Há referências à cama de tatame onde o casal costumava dormir ("cama de tatame pela vida afora") e aos três filhos frutos do relacionamento deles ("os meninos são todos sãos").

A música composta em 1981 foi gravada em 1982. Há 33 anos, Gilberto Gil gravou "Drão". Mas quem era "Drão"? Eu ouvia "Drão", e a música não me dizia nada.

"Drão" foi o apelido dado por Maria Bethânia para Sandra Gadelha, que, na época da composição da música, estava se separando de Gilberto Gil. A música completa 33 anos e continua universal. Hoje, percebo ser uma das mais belas músicas de separação já escritas. Escrita para desmentir a história que a separação é o fim do amor e o começo de desamor, mas de um amor que se transforma e se eterniza.

"Drão"é uma história de amor, ou melhor, de uma separação. Contando-a, eu me transformo, sem querer, em advogado do nosso ex-ministro da Cultura, para lhe salvar da burrice de gente como a minha pessoa que não entende, às vezes, um poeta tão profundo, capaz de compor "Se Eu Quiser Falar Com Deus", a qual Elis Regina interpretou como se fosse uma evangélica norte-americana. Ou então "Testamento do Padre Cícero", uma joia rara que poucos conhecem.

Gilberto Gil, no disco "Todas as Letras" (Cia das Letras, 2000), diz: 

"Sua criação apresentou altos graus de dificuldades porque ela lidava com um assunto denso - o amor e o desamor, o rompimento, o final de um casamento; porque era uma canção para Sandra - e para mim. 'como é que eu vou passar tantas coisas numa canção só?', eu me perguntava!

Gilberto Gil e Sandra Gadelha 'Drão' em Londres durante o exílio entre 1969 e 1972.

Sandra Gadelha, como inspiradora da canção, conta a história de como Gilberto Gil lhe mostrou a música, numa reportagem da revista Marie Claire: 

"Desde meus 14 anos, todo mundo em Salvador me chamava de Drão. Fui criada com Gal Costa, morávamos na mesma rua. Sou irmã de Dedé, primeira mulher de Caetano Veloso. Nossa rua era o ponto de encontro da turma da Tropicália. Fui ao primeiro casamento de Gil. Depois conheci Nana Caymmi, sua segunda mulher. Nosso amor nasceu dessa amizade. Quando ele se separou de Nana, nos encontramos em um aniversário de Caetano, em São Paulo, e ele me pediu textualmente: 'Quer me namorar?'. Já tinha pedido outras vezes, mas eu levava na brincadeira. Dessa vez aceitei.
Engraçado que Gil mesmo não me chamava de Drão. Antes havia feito a música 'Sandra'. Já 'Drão' marcou mais. Estávamos separados havia poucos dias quando ele fez a canção. Ele tinha saído de casa, eu fiquei com as crianças. Um dia passou lá e me mostrou a letra. Achei belíssima. Mas era uma fase tumultuada, não prestei muita atenção. No dia seguinte ele voltou com o violão e cantou. Foi um momento de muita emoção para os dois.
Nos separamos de comum acordo. O amor tinha de ser transformado em outra coisa. E a música fala exatamente dessa mudança, de um tipo de amor que vive, morre e renasce de outra maneira. Nosso amor nunca morreu, até hoje somos muito amigos. Com o passar do tempo a música foi me emocionando mais, fui refletindo sobre a letra. A poesia é um deslumbre, está ali nossa história, a cama de tatame, que adorávamos. No começo do casamento moramos um tempo com Dedé e Caetano, em Salvador, e dormíamos em tatame. Durante o exílio, em Londres, tivemos de dormir em cama normal. Mas, no Brasil, só tirei o tatame quando engravidei da Preta e o médico me proibiu, pela dificuldade em me levantar.
A primeira vez em que ouvi 'Drão' depois que Pedro, nosso filho, morreu (num acidente de carro em 1990, aos 19 anos) foi quando me emocionei mais. Com a morte dele a música passou a me tocar profundamente, acho que por causa da parte: 'Os meninos são todos sãos'. Mas é uma música que ficou sendo de todos, mexe com todo mundo. Soube que a Preta, nossa filha, chora muito quando ouve 'Drão'. Eu não sabia disso, e percebi que a separação deve ter sido marcante para meus filhos também. As pessoas me dizem que é a melhor música do Gil. Djavan gravou, Caetano também. Fui ao show de Caetano e ele não conseguia cantar essa música porque se emocionava: de repente, todo mundo começou a chorar e a olhar para mim, me emocionei também. E, engraçado, Caetano é o único dos nossos amigos que me chama de Drinha." 

O curioso é que o próprio Gilberto Gil era um dos poucos da roda de amigos que não chamava a mulher de Drão. Ele e Caetano Veloso a chamavam de "Drinha".



Drão

Drão!
O amor da gente é como um grão
Uma semente de ilusão
Tem que morrer pra germinar
Plantar nalgum lugar
Ressuscitar no chão
Nossa semeadura
Quem poderá fazer aquele amor morrer
Nossa caminhadura
Dura caminhada
Pela noite escura

Drão!
Não pense na separação
Não despedace o coração
O verdadeiro amor é vão
Estende-se infinito
Imenso monolito
Nossa arquitetura
Quem poderá fazer aquele amor morrer
Nossa caminhadura
Cama de tatame
Pela vida afora

Drão!
Os meninos são todos sãos
Os pecados são todos meus
Deus sabe a minha confissão
Não há o que perdoar
Por isso mesmo é que há de haver mais compaixão
Quem poderá fazer
Aquele amor morrer
Se o amor é como um grão
Morre, nasce trigo
Vive, morre pão
Drão!
Drão!

Chico Mineiro

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Chico Mineiro
Tonico e Francisco Ribeiro
1946

"Chico Mineiro"é o nome de uma conhecida canção brasileira à moda de viola de autoria de Tonico e Francisco Ribeiro. Foi a canção responsável por lançar a dupla Tonico & Tinoco a nível nacional.

Diversas sites atribuem a composição da música a Tonico e Tinoco, que ouviam desde criança a lenda de um certo Chico Mineiro, um boiadeiro, que só descobre ser irmão de seu melhor amigo no dia que este é assassinado, quando vai ver seus documentos. Cita-se a modesta participação de um porteiro da Rádio Tupi, Francisco Ribeiro, que perguntou a Tonico se ele conhecia a história do Chico Mineiro, fato que o levou a relembrar a história contada por seu pai e o inspirou a compor, sozinho, a canção. À dupla Tonico & Tinoco, então, é atribuída, de forma errônea, a generosidade de "ceder" a parceria na música a Francisco Ribeiro.

Fato é que essa informação não condiz com a realidade e é mera distorção do ocorrido. Conforme trecho do livro "Enciclopédia das Músicas Sertanejas", de autoria de Ayrton Mugnaini Jr., referenciado por diversos acadêmicos da área de literatura e contemporaneidade, a canção foi na verdade "uma poesia formada por 25 versos, apresentada ao Tonico, João Salvador Pérez, da dupla Tonico & Tinoco, pelo porteiro das rádios associadas, Francisco Ribeiro".

Nas palavras de Tonico, citadas na referida obra, "enquanto a poesia era lida, eu me lembrava que meu pai contava essa história e que também já a tinha ouvido em muitos lugares: se era em São Paulo, chamava-se Chico Paulista, se era em Goiás, era Chico Goiano. Mas a história era sempre a mesma!"

As variadas fontes da internet que atribuem a autoria da música apenas a Tonico também deixam de citar o lapso temporal entre o tempo de lançamento da canção, década de 40, e o reconhecimento de Francisco Ribeiro como seu co-criador, ocorrido décadas depois. Isso porque foi uma decisão judicial, em processo intentado por Francisco Ribeiro, que reconheceu sua participação na composição da música, dando direito à sua família, pois Francisco, à época do veredicto, já havia falecido, receber parte dos valores obtidos com a canção.

Tonico & Tinoco
José Perez, o Tinoco, irmão e parceiro de Tonico, contou em seu site uma versão sem, no entanto, se referir ao conhecimento prévio da lenda. Veja a transcrição do seu relato:

"Em Julho de 1946, quando o Tonico e eu chegávamos para fazer o programa na Rádio Difusora de São Paulo, fomos chamados pelo porteiro da emissora, o senhor Francisco Ribeiro, que contou-nos uma história de dois irmãos. Um saiu pelo mundo e virou peão (Chico), o segundo (Zé Mendes) tornou-se dono de tropa.
Quis o destino que se encontrassem. Pôr muitos anos trabalharam juntos, e só com a morte do Chico é que veio a revelação do parentesco entre eles.
Na década de 90, fui (Tinoco) até Goiás Velho (Antiga Capital de Goiás), onde existia na época alguns pertences, uma capela e a lenda do Chico Mineiro que vivia na lembrança de muitos moradores.
Outro detalhe que não está revelado na letra, é que Chico (O mais velho), sabia que era irmão de Zé Mendes (O mais novo) e sempre procurou defende-lo em muitas dificuldades.
Escrevemos a história numa folha de pão (que existia nas padarias), e virou um dos maiores sucessos de Tonico & Tinoco."

Uma curiosidade sobre a gravação da música é que a gravadora chegou a informar a que aquele seria o último disco da dupla, já que os ouvintes reclamavam de não entender a pronúncia caipira do interior de São Paulo usada na canção.



Chico Mineiro

Cada vez que eu me alembro
do amigo Chico Mineiro.
Das viage que nois fazia
era ele meu cumpanheiro.

Sinto uma tristeza
uma vontade de chorar.
Alembrando daqueles tempos
que não mais há de voltar.

Apesar de eu ser patrão
eu tinha no coração
o amigo Chico Mineiro.

Caboclo bom decidido,
na viola era delorido
e era o peão dos boiadero.

Hoje porém com tristeza
recordando das proeza
da nossa viage motin.

Viajemo mais de dez ano
vendendo boiada e comprando
por esse rincão sem-fim.

Caboclo de nada temia
mas porém, chegou um dia
que Chico apartou-se de mim.

Fizemos a última viagem
foi lá pro sertão de Goiás.
Fui eu e o Chico Mineiro
também foi o capataz.

Viajemos muitos dias
pra chegar em Ouro Fino.
Aonde nós passemo a noite
numa festa do Divino.

A festa tava tão boa
mas antes não tivesse ido.
O Chico foi baleado
por um homem desconhecido.

Larguei de comprar boiada
mataram meu cumpanheiro.
Acabou o som da viola
acabou-se o Chico Mineiro.

Despois daquela tragédia
fiquei mais aborrecido.
Não sabia da nossa amizade
porque nois dois era unido.

Quando vi seu documento
me cortou meu coração.
Vim saber que o Chico Mineiro
era meu legítimo irmão.

Pérola Negra

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Pérola Negra
Luiz Melodia
1971

"Eu não tinha a fissura de ser artista. Gostava de tocar e de cantar, mas não pensava em ganhar a vida com música. Tive a felicidade de estar na hora e no local certos quando uma mulher que virou minha amiga, a Rose, foi morar no morro. Ela conhecia muito os baianos, Caetano, Waly Salomão, Gal, todos eles."

Rose apresentou Luiz Melodia a Waly Salomão, que frequentava o morro para ouvir samba. O ano era 1971, e o rapaz do São Carlos já tinha um passado em bandas amadoras e em concursos de rádio, além de um punhado de composições que encantaram o poeta.

Agitador cultural nato, Waly Salomão introduziu Luiz Melodiaà sua trupe tropicalista, incluindo o poeta e jornalista Torquato Neto, que usou sua coluna "Geléia Geral", no jornal Última Hora, para divulgar o "negro magrinho com composições interessantes, do morro do São Carlos".

"O Waly e o Torquato ouviram meu trabalho, outras pessoas da zona sul vieram saber, fiquei amigo de algumas, vira e volta descia o morro para tocar em reuniões na casa da Suzana de Moraes, filha de Vinícius de Moraes, ou do Jards Macalé."

Nesses encontros começou a se destacar a canção "My Black, Meu Nego", que viraria "Pérola Negra" por sugestão de Waly Salomão, inspirado pelo apelido de um jovem gay da turma. O baiano, prestes a dirigir o show "Gal a Todo Vapor", instou Luiz Melodia a mostrar a "Pérola Negra"à dona do palco. 

"Fomos a ela num ensaio, peguei o violão e mostrei, e ela ficou apaixonada. Daí ficamos amigos, e ela falou: 'Vou pôr no meu disco'. Foi um acontecimento!"

De fato, a reboque do sucesso de "Gal a Todo Vapor" - que lotava ininterruptamente o Teatro Tereza Rachel, em Copacabana, e seria registrado em célebre disco ao vivo - "Pérola Negra" estourou e jogou luz sobre seu compositor Luiz Melodia.

"A gente conheceu o Luiz Melodia em 1972, por causa da gravação da Gal Costa. Foi o [arranjador] Perinho Albuquerque quem me disse que tinha um cara com umas músicas muito boas", contou o músico Roberto Menescal, àquela altura diretor artístico da principal gravadora da Música Popular Brasileira, a Philips/Phonogram.

"Saquei que já não era mais a bossa nova, a tropicália. Estavam chegando Raul Seixas, Sérgio Sampaio, Fagner. Fiquei de olho nessa turma. Quando o Perinho me falou, fui sacar as músicas do Melodia e o contratei."
(Roberto Menescal)

Na época, Luiz Melodia passou a ser empresariado pelo poderoso Guilherme Araújo. "Eu tinha, de certa forma, costas bem quentes: ele tinha todo mundo, o Caetano, o Gil, a Gal. Me tornei o caçula, tinha todo um aparato em que confiei e que foi consistente."

Para um jovem desconhecido, vindo do morro, conviver com a turma do desbunde na Ipanema do amor livre e das "dunas do barato" foi um choque cultural.

"Eu era um cara à parte da situação, era um menino. Lembro que, quando a Gal, aquela mulher linda e gostosíssima, sentava na minha frente de perna aberta, eu não entendia picas. E era uma coisa natural."

Como e Quando?

"A criação de 'Pérola Negra'é uma história curiosa. Na época eu servia o exército, era bem jovem, tinha 19, 20 anos, e nem tinha terminado essa música ainda. Faltavam ainda umas pouquíssimas frases, e eu conheci o Waly Salomão, que falou o que ele achava.
Lembro que a minha grande inspiração era uma mulher negra muito bonita, irmã de um parceiro meu. E tinha também um menino gay que morava no Morro de São Carlos, apelidado de Pérola Negra, e aproveitei para prestar uma homenagem a ele.
É bem curioso, né? Eu tinha esperança de seguir carreira, mas já estava meio que pensando em arranjar emprego. Mas daí o Waly Salomão, que, na época, dirigia o show de Gal Costa, ficou encantado com o meu trabalho. Não só ele como também o Torquato Neto, que escrevia no jornal Última Hora a coluna 'Geleia Geral' e sempre comentava sobre o meu dia a dia, que eu era um compositor genial. Eu tive a sorte e a graça de conhecê-lo. Na verdade, todo esse pacote: Waly SalomãoTorquato Neto, Gal Costa cantar no show 'Gal Fatal' e ter gravado a música no disco 'Gal a Todo Vapor'.
Depois veio 'Estácio Holly Estácio', que a Maria Bethânia gravou, e, em seguida, eu gravei meu disco, 'Pérola Negra', com arranjos do Perinho Albuquerque. Achei o resultado maravilhoso, até porque eu estava começando e tudo era esplêndido. Antes de gravar o disco, eu já tinha feito shows no Teatro Opinião, as pessoas já sabiam de mim e as coisas foram acontecendo."
(Luiz Melodia)


Pérola Negra

Tente passar pelo que estou passando
Tente apagar este teu novo engano
Tente me amar pois estou de amando
Baby, te amo, nem sei se te amo

Tente usar a roupa que estou usando
Tente esquecer em que ano estamos
Arranje algum sangue, escreva num pano
Pérola Negra, te amo, te amo

Rasgue a camisa, enxugue meu pranto
Como prova de amor mostre teu novo canto
Escreva num quadro em palavras gigantes
Pérola Negra, te amo, te amo

Tente entender tudo mais sobre o sexo
Peça meu livro querendo eu te empresto
Se intere da coisa sem haver engano
Baby, te amo, nem sei se te amo
Baby, te amo, nem sei se te amo
Baby, te amo, nem sei se te amo


Me Chama

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ME CHAMA
Lobão
1984

Com o único álbum que lançou acompanhado da banda Os Ronaldos, Lobão emplacou o maior sucesso de sua carreira, que teve como maior mérito posicioná-lo em um patamar único no rock nacional: o de ser o compositor solitário de uma música regravada por artistas tão diversos como Marina Lima e João Gilberto. A versão do papa da bossa, aliás, omite o refrão que tornou a canção originalmente famosa.
(Pablo Miyazawa)

"Me Chama"é um dos maiores sucessos da carreira de Lobão, lançada em 1984, regravada por diversos cantores, a canção ganhou o Brasil com o álbum "Ronaldo Foi Pra Guerra", do antigo grupo de Lobão, chamado Lobão e os Ronaldos.

Lobão fala sobre a criação da música:

"'Me Chama' foi feita aos pedaços. Primeiro, me veio na cabeça uma frase de constatação que me perseguia: 'Nem sempre se vê mágica no absurdo'. Foi a motivação original para que eu pensasse em transformar aquilo numa canção. Em seguida, fiz uma linha melódica que acabou migrando para se tornar 'Noite e Dia', parceria com o Julio Barroso. E lá estava a frase, órfã novamente, esperando por outra melodia.
Dois anos depois, estava dedilhando o violão e me veio uma linha que tinha achado particularmente vulgar. Coisa que logo descartaria, não fosse por um amigo, que ouviu o som:
'Isso é um puta hit! Acaba logo isso!'
Pronto, já tinha uma melodia e uma frase. Mas faltava o resto, a 'lágrima no escuro'. Meses depois, voltei da Holanda, onde deixei minha namorada lá por seu pai ter morrido, e a 'nem sempre se vê' voltou a martelar. Sozinho, por puro tédio, decidi pintar as paredes da sala num dia de frio, chuva e telefone cortado. Como só recebia ligação de fora, eu olhava para o telefone e vinha a premente necessidade de rezar para ela me ligar. Daí, nasceu a canção como a conhecemos.
Me orgulho de ter uma canção que muitos gostam de cantar e gravar. Na versão da Marina, inclusive, fui eu quem gravou a bateria. Um pouco preocupado, pois achava que o refrão tinha que ser mais cadenciado para passar a dramaticidade da frase. Ela achava o oposto, que o refrão era um puta gancho se fosse tocado de um modo mais 'pra frente'. Toquei como ela queria e fiquei feliz por ter deixado a Marina satisfeita, e por ter sido ela a responsável pela canção virar um sucesso.
Quanto à versão do João Gilberto, achei carinhoso da parte dele inserir uma canção minha em seu repertório, uma vez que ele já não gravava nada diferente havia uns 20 anos. O arranjo ficou lindo, a interpretação impecável. Minha pequena aflição consiste em perceber que a frase do refrão que originou a música foi evaporada. Depois, vim a saber, pelo próprio João Gilberto, que ele a tirou por não ter entendido o significado. Como já dizia eu, nem sempre se vê mágica no absurdo."


Me Chama

Chove lá fora e aqui tá tanto frio, 
me dá vontade de saber.
Aonde está você? 
Me telefona 
Me Chama! Me Chama! 
Me Chama!... 

Nem sempre se vê 
Lágrima no escuro 
Lágrima no escuro 
Lágrima!... 

Tá tudo cinza sem você, tá tão vazio 
E a noite fica sem porque.
Aonde está você? 
Me telefona 
Me Chama! Me Chama! 
Me Chama... 

Nem sempre se vê! 
Mágica no absurdo 
Mágica no absurdo 
Mágica!... 

Nem sempre se vê! 
Lágrima no escuro 
Lágrima no escuro 
Lágrima!... 

Nem sempre se vê! 
Mágica no absurdo 
Mágica no absurdo 
Mágica!... 

Nem sempre se vê! 
Lágrima no escuro 
Lágrima no escuro 
Lágrima!...

Preciso Me Encontrar

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Preciso Me Encontrar
Candeia
1976

"Preciso Me Encontrar" é uma música composta por Candeia a pedido do jornalista e escritor Juarez Barroso, falecido em 1976.

A canção ficou conhecida na voz de Cartola, em 1976, e depois gravada com grande sucesso pela cantora Marisa Monte, filha de Carlos Monte, ex-diretor da Portela, em seu disco de estréia "MM", em 1989. A música também fez parte da trilha sonora do filme "Cidade de Deus" (2002), de Fernando Meirelles e Katia Lund, na versão de Cartola.

Numa cadeira de rodas, Candeia temia que sentissem pena dele. Até que um dia os amigos conseguiram fazê-lo se reencontrar com o público. Foi numa noite, no Teatro Opinião. A casa cheia de amigos e convidados, ele entrou em sua cadeira de rodas e foi cantando um samba novo, "De Qualquer Maneira", ao som de um violão.

Poucos conseguiram conter as lágrimas. A peça "É Sangue na Veia, é Candeia", de Eduardo Rieche, vencedora do concurso nacional de dramaturgia promovido pelo Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em 2007, mostrou a cena. Candeia lutou contra a melancolia até o fim da vida, mas ela não o abandonou. Nos versos de "Preciso Me Encontrar", a sombra da tragédia pessoal.

No álbum "Vida Que Segue", Zeca Pagodinho reviveu Candeia ao interpretar "Preciso Me Encontrar". Neste álbum, Zeca Pagodinho canta a música de Candeia acompanhado de Marisa MonteHamilton de Holanda no bandolim e Yamandú Costa no violão.

O sambista Candeia, Antonio Candeia Filho, nasceu no Rio de Janeiro, escreveu seu primeiro samba aos 17 anos e iniciou sua carreira artística na Portela. Para conhecer mais sobre o artista, visite o blog Famosos Que Partiram.


Preciso Me Encontrar

Deixe-me ir preciso andar
Vou por aí a procurar
Sorrir pra não chorar
Deixe-me ir preciso andar
Vou por aí a procurar
Sorrir pra não chorar

Quero assistir ao sol nascer
Ver as águas dos rios correr
Ouvir os pássaros cantar
Eu quero nascer, quero viver

Deixe-me ir preciso andar
Vou por aí a procurar
Sorrir pra não chorar

Se alguém por mim perguntar
Diga que eu só vou voltar
Depois que me encontrar

Quero assistir ao sol nascer
Ver as águas dos rios correr
Ouvir os pássaros cantar
Eu quero nascer, quero viver

Deixe-me ir preciso andar
Vou por aí a procurar
Sorrir pra não chorar
Deixe-me ir preciso andar
Vou por aí a procurar
Sorrir pra não chorar
Deixe-me ir preciso andar
Vou por aí a procurar
Sorrir pra não chorar



Panis Et Circensis

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Panis Et Circensis
Gilberto Gil e Caetano Veloso
1968

"Mas as pessoas na sala de jantar, são ocupadas em nascer e morrer!"

O nome veio do uso errôneo de uma expressão latina, que Décio Pignatari viria chamar de "delicioso provincianismo de vanguarda". A confusão continua até hoje: na edição mais recente do álbum, o nome é grafado como "circencis" na capa, sendo usadas também as formas "circenses" e "circences" na contracapa.

A política do Pão e Circo (Panis Et Circensis) foi criada pelos antigos romanos, que estavam preocupados com a falta de alimento e principalmente de diversão do povo. Segundo os antigos romanos, sem estas duas coisas, era impossível se ver em sociedade e a insatisfação do povo perante os governantes só aumentaria.

Conta a história que sangrentas lutas entre gladiadores foram criadas para divertir o povo, que também recebia pão gratuito durante as lutas.

A canção "Panis Et Circensis", composta por Gilbeto Gil e Caetano Veloso se tornou o grande hino do movimento Tropicália, que estourou no Brasil no final da década de 60 e conseguiu universalizar a linguagem da Música Popular Brasileira com a introdução da guitarra elétrica, do rock psicodélico e das correntes jovens do mundo na época. Foi a união do pop, com o psicodelismo e a estética que deram à música brasileira uma essência que influenciou toda a cultura nacional.

"Panis Et Circensis", interpretada pelos músicos psicodélicos Os Mutantes traz a mensagem do que o movimento pretendida. Com uma letra que diz que as pessoas estão muito acomodadas e não lembram mais que a vida não é apenas nascer e morrer, deram um choque em toda a sociedade. Além disso, o teclado e a guitarra elétrica contribuíram para mostrar que a música brasileira precisava sair um pouco do patamar banquinho-violão, gerando grande euforia e alegrias nos jovens.

A canção é a principal do álbum "Tropicália", que além de Os Mutantes, conta com composições e interpretações de Caetano Veloso, Gilberto Gil, Rogério Duprat, Gal Costa, Torquato Neto, Tom Zé, entre outros.


Panis Et Circensis

Eu quis cantar,
minha canção iluminada de Sol.
Soltei os panos sobre os mastros no ar,
soltei os tigres e os leões nos quintais.
Mas as pessoas na sala de jantar,
são ocupadas em nascer e morrer

Mandei fazer,
de puro aço luminoso um punhal.
Para matar o meu amor e matei,
às cinco horas na avenida central.
Mas as pessoas na sala de jantar,
são ocupadas em nascer e morrer.

Mandei plantar,
folhas de sonho no jardim do solar.
As folhas sabem procurar pelo sol,
e as raízes procurar, procurar.

Mas as pessoas na sala de jantar
Essas pessoas na sala de jantar
São as pessoas da sala de jantar
Mas as pessoas na sala de jantar
São ocupadas em nascer e morrer


O Divã

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O Divã
Roberto Carlos e Erasmo Carlos
1972

Depois do estupendo disco de 1971, Roberto Carlos deu adeus à música negra norte-americana. Lançou em 1972, o disco, que talvez seja o mais melancólico, porém notável pela qualidade, feito com apuro e proficiência. Mais uma vez os belíssimos arranjos de Jimmy Wisner em "A Janela" e "A Distância" dão o tom do disco. As composições com o parceiro Erasmo Carlos mostram Roberto Carlos maduro, sereno e reflexivo. Ele encanta ao se mostrar encantado observando uma desconhecida grávida em "Você é Linda", emociona qualquer um ao questionar o acidente do qual foi vítima em "O Divã", surpreende com interpretação magistral em "Como Vai Você", de Antônio Marcos e ainda embala nossos sonhos em "Acalanto", de Dorival Caymmi

"O Divã" traz reminiscências da infância com mais referências ao pai, à mãe, aos irmãos e ao momento do acidente que o marcou para sempre:

"Relembro bem a festa, o apito
e na multidão um grito
o sangue no linho branco..."

Trecho no qual lembra o clima festivo que havia em Cachoeiro de Itapemerim antes da tragédia, a chegada do trem, o desespero e a mancha de seu sangue na roupa do homem que o socorreu.

"Fiz essa música quando vivia um momento de muita angústia no Rio de Janeiro, era um momento difícil. Fiquei lá quarenta dias e por uma série de razões depois voltei a São Paulo. Deitei no divã porque era um desafio!"
(Roberto Carlos)

Na época, o cantor não fazia análise, mas fantasiou isto na música, especialmente no trecho:

"eu venho aqui, me deito e falo pra você que só me escuta..."

Numa entrevista a Ronaldo Bôscoli, em 1977, o cantor afirmou que todos esses acontecimentos o fizeram amadurecer precocemente.

"Muito cedo tive contato com situações violentas, duras. Bicho, eu tenho quase setenta anos. Quando do meu desastre, perdi uns quinze anos. Depois, naquela noite fria da Holanda quando eu e Nice fomos tentar recuperar a visão do meu filho, perdi outros quinze. Envelheci quinze anos numa sala de espera. Foi o maior sentimento de impotência e solidão que senti na vida. Maior mesmo que o acidente que sofri tão menino!"

Talvez por tudo isso muitos vejam estampado no seu rosto uma indelével, indescritível, profunda e incorrigível tristeza, que é reforçada pelas próprias fotos de capa de seus álbuns, nas quais, em sua maioria, ele se exibe com um olhar muito melancólico, num semblante que parece de uma tristeza milenar.

Nesta casa nasceu e morou até os 13 anos, Roberto Carlos Braga, com deus pais Laura e Robertino, e seus irmãos Norma, Carlos Alberto e Lauro. 
A Infância e "O Divã"

O caçula Roberto Carlos Braga nasceu no dia do índio, 19/04/1941, às 5:00 hs, pesando 2,250 kg e medindo 42cm. A família morava na Rua Índios Crenaques, coincidência que o garoto gostava de comentar com seus colegas na escola. Essa rua que mais tarde teve seu nome mudado para João de Deus Madureira era mais conhecida mesmo por Rua da Biquinha, porque ali há uma bica de água natural muito utilizada pelos moradores. Embora estreita, sem saída e sem calçamento, é uma rua próxima do centro da cidade, começando ao pé da linha do trem da Leopoldina e terminando ao pé do Morro do Faria. E ali Roberto Carlos viveu sua infância, numa casa modesta, com varanda e muitas flores na janela, como ele descreve na canção "O Divã".

"Era uma casa realmente simples, com três quartos, uma sala e um quintal onde havia uma árvore alta que dava uma fruta pegajosa, cujo leite, quando seco, a gente mastigava e chamava de chiclete!"
(Recorda Roberto Carlos)

O Acidente

O fato aconteceu numa manhã de domingo, 29/06/1947, dia de São Pedro. A brisa deslizava do alto das serras. Naquele dia, Cachoeiro de Itapemerim amanheceu sorrindo e em festa para saudar o seu santo padroeiro que, segundo a Igreja Católica, foi morto e crucificado nessa data em Roma, durante o reinado do imperador Nero, no ano 65 d.C.

Era feriado na cidade, dia de desfiles, músicas, bandeiras, discursos, ruas cheias de gente e muita alegria. As duas bandas da cidade, a Lira de Ouro e a Banda 26 de Julho, faziam retreta na praça, tocando dobrados e muitos meninos já brincavam em volta do coreto ouvindo os músicos tocar.

Como tantas outras crianças da cidade, naquele dia Roberto Carlos saiu cedo e animado de casa para assistir aos festejos. Era tanta badalação que muitos pais preparavam roupa nova para os filhos estrearem justamente nesse dia. Por isso Zunga estava ainda mais contente, porque iria desfilar com os sapatinhos novos que ganhara na véspera. E qual criança não fica feliz ao ganhar uma roupinha ou um novo par de sapatos?

Logo que saiu à porta de casa, Roberto Carlos se encontrou com sua amiga Eunice Solino, uma menina da sua idade, que ele carinhosamente chamava de Fifinha. Frequentemente os dois estavam juntos, porque moravam na mesma rua e, mais tarde, foram estudar no mesmo colégio. Por várias vezes, a caminho da escola, era ela quem carregava o material de Roberto Carlos.

"Fifinha foi a minha grande companheira da infância!"

Pois naquela manhã os dois desceram mais uma vez juntos em direção ao local dos desfiles. Ao chegarem num largo, logo abaixo da rua em que moravam, já encontraram todos em plena euforia. Desfiles escolares, balizas e muitos balões coloriam o céu do pequeno Cachoeiro, ao mesmo tempo em que locomotivas se movimentavam para lá e para cá. Construída na época dos barões do café, no século XIX, quando a cidade era um paradouro de trem de carga, a Estrada de Ferro Leopoldina Railways atravessava Cachoeiro de ponta a ponta.

Roberto Carlos
Por volta de nove e meia da manhã, Zunga e Fifinha pararam numa beirada entre a rua e a linha férrea para ver o desfile de um grupo escolar. Enquanto isso, atrás deles, uma velha locomotiva a vapor, conduzida pelo maquinista Walter Sabino, começou a fazer uma manobra relativamente lenta para pegar o outro trilho e seguir viagem.

Uma das professoras que acompanhava os alunos no desfile temeu pela segurança daquelas duas crianças próximas do trem em movimento e gritou para elas saírem dali. Mas, ao mesmo tempo em que gritou, a professora avançou e puxou pelo braço a menina, que caiu sobre a calçada. Roberto Carlos se assustou com aquele gesto brusco de alguém que ele não conhecia, recuou, tropeçou e caiu
na linha férrea segundos antes da locomotiva passar. A professora ainda gritou desesperadamente para o maquinista parar o trem, mas não houve tempo. A locomotiva avançou por cima do garoto que ficou preso embaixo do vagão, tendo sua perninha direita imprensada sob as pesadas rodas de metal.

E assim, na tentativa de evitar a tragédia com duas crianças, aquela professora acabou provocando o acidente com uma delas.

Diante da gritaria e do corre-corre, o maquinista Walter Sabino freou o trem, evitando consequências ainda mais graves para o menino, que, apesar da pouca idade, teve sangue-frio bastante para segurar uma alça do limpa-trilhos que lhe salvou a vida.

Uma pequena multidão logo se aglomerou em volta do local e, enquanto uns foram buscar um macaco para levantar a locomotiva, outros entravam debaixo do vagão para suspender o tirante do freio que se apoiava sobre o peito da criança. Com muita dificuldade, ela foi retirada de debaixo da pesada máquina carregada de minério de ferro.

"Eu estava ali deitado, me esvaindo em sangue", recordaria Roberto Carlos anos depois numa entrevista. Mas naquele momento alguém atravessou apressado a multidão barulhenta e tomou as providências necessárias.

"Será uma loucura esperarmos a ambulância", gritou Renato Spíndola e Castro, um rapaz moreno e forte, que trabalhava no Banco de Crédito Real. Providencialmente, Renato tirou seu paletó de linho branco e com ele deu um garrote na perna ferida do garoto, estancando a hemorragia.

"Até hoje me lembro do sangue empapando aquele paletó. E só então percebi a extensão do meu desastre", afirmou Roberto Carlos, que desmaiou instantes após ser socorrido. Esse momento trágico de sua vida ele iria registrar anos depois no verso de sua canção "O Divã", quando diz:

"Relembro bem a festa, o apito / e na multidão um grito / o sangue no linho branco...", numa referência à cor do paletó que Renato Spíndola usava no momento em que o socorreu.

Roberto Carlos
Naquela época em Cachoeiro do Itapemerim poucas pessoas possuíam automóvel e Renato Spíndola era uma delas. Ele pegou Roberto Carlos nos braços, colocou-o no banco de seu velho Ford e partiu a
toda velocidade rumo ao hospital da Santa Casa de Misericórdia de Cachoeiro, o único hospital daquela região.

"Foi uma longa viagem. 'Traumas', uma de minhas composições conta bem isso", diz Roberto Carlos, citando outra canção confessional, lançada por ele em 1971, que em um dos versos fala do "delírio da febre que ardia / no meu pequeno corpo que sofria / sem nada entender...".

No meio daquele corre-corre, com várias crianças espalhadas pelas ruas, pais e mães se desesperavam. Chamavam por seus filhos. Perguntavam quem era a criança atingida. Qual o nome dela. A confirmação não demorou. É o Zunga, um menino que mora na Rua da Biquinha.

O acidente mudou o roteiro daquele dia em Cachoeiro. Para muita gente a festa perdeu a graça. O feriado acabou. Muitas crianças voltaram para suas casas.

"Lembro que eu estava desfilando toda prosa de luvas e de uniforme quando houve aquele alvoroço e o desfile dispersou. Todo mundo correu pra ver. É uma coisa de que jamais me esqueci. Houve uma dispersão geral", afirmou a pianista Elaine Manhães, que na época tinha quinze anos e desfilava pelo Liceu Muniz Freire.

Ao longo daquele dia, nas ruas, nos bares, nas residências, todos na pequena cidade só comentavam o acidente que vitimara o filho da costureira Laura e do relojoeiro Robertino. Como aconteceu isto? Era a pergunta que mais se fazia na cidade. Foi quando começaram a surgir as mais variadas e fantasiosas versões para o acidente, num disse-medisse que chegou até os dias de hoje.

Acidentes com trem não eram raridade em Cachoeiro de Itapemirim, já que a linha férrea cortava todo o perímetro urbano da cidade. Inúmeros registros estavam na imprensa desde os primórdios, principalmente envolvendo pedestres bêbados na periferia. Esse novo caso ganhou uma repercussão maior na época porque envolveu uma criança, foi no centro da cidade e aconteceu no dia dos festejos do padroeiro, quando havia uma grande movimentação de pessoas nas ruas.

Roberto Carlos
Ao chegar ao hospital, Zunga foi imediatamente atendido pelo médico Romildo Coelho, de 36 anos, que estava de plantão naquele domingo. Segundo ele, ao ver o menino constatou que a parte de baixo da perna acidentada estava pendurada apenas pela pele, mas o garoto não chorava muito, porque não estaria sentindo dor.

"Quando o trem esmagou a perna, arrancou todos os nervos e tirou a sensibilidade", explicou o médico. Ele recorda que o menino parecia ainda não ter a noção exata da gravidade do acidente. Em certo momento, ele apontou para o sapato que estava na perna acidentada e me disse: "Doutor, cuidado para não sujar muito o meu sapato porque ele é novo". Foi uma reação típica de uma criança, e de uma criança que não estava acostumada a ganhar sapatos novos com muita frequência.

Os pais e irmãos de Roberto Carlos só ficaram sabendo do fato quando ele já tinha sido socorrido pelo bancário Renato Spíndola. Em seguida foram todos imediatamente para o hospital, sem ainda saber a real gravidade do acidente. A primeira reação foi de revolta contra o maquinista Walter Sabino. O pai de Roberto Carlos estava convencido de que aquilo fora resultado de imprudência e desatenção do condutor do trem. Este, por sua vez, se explicava dizendo que não viu ninguém na linha férrea no momento em que fez a manobra para pegar um outro trilho e seguir viagem. Quando ele percebeu alguma coisa, numa fração de segundo a máquina já tinha atingido o garoto. Robertino Braga não se conformava e queria fazer justiça com as próprias mãos.

"Ele ficou tão fora de si que disse que ia matar meu marido. Walter teve que se esconder dentro da estação até que Robertino se acalmasse", afirma Anita Sabino, esposa do maquinista.

Naquela mesma manhã, no hospital da Santa Casa, o médico aplicou uma anestesia local de novocaína no acidentado e deu início à cirurgia. Para distrair um pouco a criança, o doutor Romildo pegava uma folha de papel em branco e ficava recortando bichinhos como peixes, lagartixas, cavalos.

Roberto Carlos precisou usar muletas até os 15 anos de idade, quando recebeu sua primeira prótese.


O Divã

Relembro a casa com varanda
Muitas flores na janela
Minha mãe lá dentro dela
Me dizia num sorriso
Mas na lágrima um aviso
Pra que eu tivesse cuidado
Na partida pro futuro
Eu ainda era puro
Mas num beijo disse adeus

Minha casa era modesta
Mas eu estava seguro
Não tinha medo de nada
Não tinha medo de escuro
Não temia trovoada
Meus irmãos à minha volta
E meu pai sempre de volta
Trazia o suor no rosto
Nenhum dinheiro no bolso
Mas trazia esperanças

Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Por isso eu venho aqui

Relembro bem a festa, o apito
E na multidão um grito
O sangue no linho branco
A paz de quem carregava
Em seus braços quem chorava
E no céu ainda olhava
E encontrava esperança
De um dia tão distante
Pelo menos por instantes
encontrar a paz sonhada

Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Por isso eu venho aqui

Eu venho aqui me deito e falo
Pra você que só escuta
Não entende a minha luta
Afinal, de que me queixo
São problemas superados
Mas o meu passado vive
Em tudo que eu faço agora
Ele está no meu presente
Mas eu apenas desabafo
Confusões da minha mente

Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Essas recordações me matam
Essas recordações me matam

O Sol Nascerá

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O Sol Nascerá
1961
Cartola e Elton Medeiros

"O Sol Nascerá"é uma canção composta pelo sambista Cartola, em parceria com Elton Medeiros. A canção foi composta em 1961 na casa de Cartola, na época muito frequentada por diversos sambistas, entre os quais Zé Keti, Nelson Cavaquinho e Elton Medeiros, este último co-autor de "O Sol Nascerá".

Segundo Elton Medeiros, a letra nasceu de maneira improvisada. Cartola e ele haviam acabado de compor um samba chamado "Castelo de Pedrarias", quando chegou o amigo Renato Agostini, que após ouvir o novo samba desafiou os compositores a fazer outra letra, ali na hora, em sua presença. Pouco depois estava pronto o samba "O Sol Voltará".

Três anos depois do episódio, a canção foi uma das escolhidas para integrar o álbum de estreia de Nara Leão, até então considerada uma musa da Bossa Nova. Na gravação, atendendo a um pedido do produtor Aloysio de Oliveira, o título foi alterado para "O Sol Nascerá".

Considerado como um marco da redescoberta de Cartola durante a década de 60 e também da revelação de Elton Medeiros como compositor, "O Sol Nascerá" foi gravado pelo próprio Cartola para o seu álbum homônimo, o primeiro de sua carreira, tendo arranjo de Dino 7 Cordas.

Um ano antes, havia sido gravada para o também disco de estreia de Elton Medeiros, em um pot-pourri com o samba "Mascarada", ambos com arranjo de Orlando Silveira.

Álbum de Cartola, 1974

Cavaquinho: Waldiro Frederico Tramontano (Canhoto)
Pandeiro: Gilberto D'Ávila e Jorge José da Silva (Jorginho do Pandeiro)
Surdo: Gilberto D'Ávila
Tamborim: Luna
Cuíca: Nilton Delfino Marçal (Marçal)

Álbum de Elton Medeiros, 1973

Violão: Cristóvão Bastos
Ritmo: Dazinho, Elizeu Felix, Geraldo Sabino e Nilton Delfino Marçal (Marçal)
Caixa de Fósforo: Elton Medeiros
Cavaquinho: Jonas Pereira da Silva
Bateria: Juquinha

Outras Versões
  • 1964 - Nara Leão: "Nara"
  • 1965 - Elis Regina e Jair Rodrigues: "Dois Na Bossa"
  • 1965 - Eumir Deodato: "Ataque"
  • 1988 - Leny Andrade: "Cartola 80 Anos"
  • 1998 - Márcia: "Cartola 90 Anos"
  • 2002 - Ney Matogrosso: "Ney Matogrosso Interpreta Cartola"
  • 2003 - Paulinho da Viola: "Meu Tempo É Hoje


O Sol Nascerá

A sorrir
Eu pretendo levar a vida
Pois chorando
Eu vi a mocidade
Perdida

Finda a tempestade
O sol nascerá
Finda esta saudade
Hei de ter outro alguém para amar

A sorrir
Eu pretendo levar a vida
Pois chorando
Eu vi a mocidade
Perdida

Pelo Telefone

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Pelo Telefone
Donga e Mauro de Almeida
1916

"Pelo Telefone" é considerado o primeiro samba a ser gravado no Brasil segundo a maioria dos autores, a partir dos registros existentes na Biblioteca Nacional.

Composição de Ernesto dos Santos, mais conhecido como Donga, e do jornalista Mauro de Almeida. Foi registrada em 27/11/1916 como sendo de autoria apenas de Donga, que mais tarde incluiu Mauro de Almeida como parceiro.

"Pelo Telefone" foi concebida em um famoso terreiro de candomblé daqueles tempos, a casa da Tia Ciata, na Praça Onze, frequentada por grandes músicos da época. Por ter sido um grande sucesso e devido ao fato de ter nascido em uma roda de samba, de improvisações e criações conjuntas, vários foram os músicos que reivindicaram a autoria da composição. A melodia, originalmente, intitulava-se"Roceiro" e foi uma criação coletiva, com participação de João da Baiana, Pixinguinha, Caninha, Hilário Jovino Ferreira, Sinhô, entre outros.
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"Pelo Telefone" marca o início do reinado da canção carnavalesca. É a partir de sua popularização que o carnaval ganha música própria e o samba começa a se fixar como gênero musical. Desde o lançamento, quando apareceram vários pretendentes à sua autoria, e mesmo depois, quando já havia sido reconhecida sua importância histórica, essa melodia seria sempre objeto de controvérsia, tornando-se uma de nossas composições mais polêmicas em todos os tempos.

Quase tudo que a este samba se refere é motivo de discussão: a autoria, a afirmação de que foi o primeiro samba gravado, a razão da letra e até sua designação como samba. Todas essas questões, algumas irrelevantes, acabaram por se integrar à sua história, conferindo-lhe mesmo um certo charme.

"Pelo Telefone" tem uma estrutura ingênua e desordenada: a introdução instrumental é repetida entre algumas de suas partes (um expediente muito usado na época) e cada uma delas tem melodias e refrões diferentes, dando a impressão de que a composição foi sendo feita aos pedaços, com a junção de melodias escolhidas ao acaso ou recolhidas de cantos folclóricos.

Outra versão, relatada por Donga a Ary Vasconcelos e ao jornalista Eduardo Sucupira Filho, é a de que "Pelo Telefone" teria surgido de uma estrofe a ele transmitida por um tal Didi da Gracinda, elemento ligado ao grupo de Hilário Jovino. Já Mauro de Almeida, que parece nunca ter-se preocupado em afirmar sua participação na autoria, declarou, em carta ao jornalista Arlequim, ser apenas o "arreglador" dos versos, o que corresponderia à verdade.

"Pelo Telefone" foi lançado em discos Odeon, em dezembro de 1916, simultaneamente pelo cantor Bahiano e a Banda da Casa Edison.

Bahiano
Primeiro Samba?

Em 1917, o samba "Pelo Telefone" se transformou no marco inicial da história fonográfica daquele gênero musical. Historiadores, porém já registraram, em suas pesquisas, gravações anteriores que podem ser reconhecidas como samba e que comprovadamente foram gravadas antes da composição assinada pela dupla Donga e Mauro de Almeida. O sucesso comercial de Fred Figner e sua Casa Edison, no Rio de Janeiro, provocou o aparecimento de concorrentes no Brasil inteiro e uma variedade enorme de selos fonográficos surgiu. A maioria de vida curta, mas que acabou por contribuir culturalmente com a Música Popular Brasileira e influir na instalação da indústria fonográfica no país.

A gravadora Odeon, por exemplo, que registrou o chamado samba pioneiro, antes dele já havia gravado, na série lançada entre 1912 e 1914, "Descascando o Pessoal" e "Urubu Malandro", classificados como sambas no próprio catálogo da fábrica.

Na série de 1912 a 1915 consta "A Viola Está Magoada" de Catulo da Paixão Cearense e interpretada por Bahiano e Júlia Martins, além de "Moleque Vagabundo" de Lourival Carvalho, também identificados como samba.

"Pelo Telefone" tem o número de série 121313, mas anteriores a ele são ainda "Chora, Chora, Choradô" (121057), cantado por Bahiano, "Janga" (121165), com o Grupo Paulista, e "Samba Roxo" (121176), com Eduardo das Neves.

O selo Columbia editou série entre 1908 e 1912, aparecendo nela como samba a gravação "Michaella", interpretada por Bartlet, "Quando a Mulher Não Quer", com Arthur Castro, e "No Samba", gravado por Pepa Delgado e Mário Pinheiro.

A Favorite Record gravava na Europa para a Casa Faulhaber do Rio de Janeiro, entre 1910 e 1913, e em seu catálogo se encontrava a gravação do samba "Em Casa de Baiana", com o Conjunto da Casa Faulhaber, identificada na abertura como "samba de partido-alto". O disco tem o título simples de "Samba", sem indicação de intérprete ou autoria. O selo Phoenix também pertencia à família Figner. Gravou de 1914 a 1918 para a Casa Edison de São Paulo.

Os sambas que nele aparecem são anteriores a 1915, ano da gravação "Flor do Abacate" (70.711), como provam suas numerações: "Samba do Urubu" (70.589), com o Grupo do Louro, "Samba do Pessoal Descarado" (70.623), com o Grupo dos Descarados, "Vadeia Caboclinha" (70.691), com o Grupo Tomás de Souza, e "Samba dos Avacalhados" (70.693), com o Grupo do Pacheco, Coro e Batuque. Da mesma maneira como existem dúvidas quanto à verdadeira autoria de "Pelo Telefone", não se pode concluir com inteira certeza qual o primeiro samba realmente gravado.

Pixinguinha, João da Bahiana e Donga
Outros Compositores

A história oral menciona vários autores para o samba "Pelo Telefone", mas quando Donga fez seu registro na Biblioteca Nacional omitiu todos, declarando ser seu único compositor. As primeiras partituras, ainda na ortografia da época, que grafava Telephone, exibiam apenas o nome de Donga. A grita que se seguiu não teve muitos resultados, mas pelo menos serviu para que Mauro de Almeida fosse reconhecido como um dos parceiros. O Peru dos Pés Frios, como era conhecido o jornalista carnavalesco, faleceu pouco tempo depois da gravação do samba, ficando todas as luzes apenas sobre Donga, que delas sempre soube tirar proveito pessoal.

O sucesso cercou "Pelo Telefone" de aspectos os mais variados, fugindo da simples conseqüência musical, de cair na preferência popular, no assobio das calçadas e na cantoria das festinhas de subúrbio. Logo um sem-número de pais-da-criança apareceu, cada um puxando a brasa para sua sardinha, todo mundo ignorando a iniciativa de Donga em registrar oficialmente sua autoria na Biblioteca Nacional.

Como se sabe, o samba vinha sendo cantado na casa de Tia Ciata de maneira informal, como partido alto com a participação da dona da casa, emérita partideira que com certeza introduziu nele seus improvisos, o mesmo fazendo seu genro Mestre Germano e o ranchista Hilário Jovino.

Da cantoria, lá pelo ano de 1916, participavam também Donga, o jornalista Mauro de Almeida, a quem Almirante credita a autoria indiscutível do samba, João da Mata, o dono do refrão, e o conflituoso Sinhô, que como autor da frase "Samba é como passarinho, está no ar, é de quem pegar!", evidentemente tentou também se apossar da paternidade da novidade. Ironizando a atuação de Aurelino Leal, o novo chefe de policia do Rio de Janeiro, o samba teve seus versos fixados por Mauro de Almeida, que nem assim foi reconhecido como co-autor no registro da Biblioteca Nacional.

Cantado em público pela primeira vez, segundo Almirante, no Cinema Teatro Velo, à Rua Haddock Lobo, na Tijuca, despertou de imediato a cobiça alheia e, com razão ou sem ela, contestações quanto à autoria de Donga pipocaram de todos os lados. A principal veio de Tia Ciata, criando uma briga que jamais chegou à reconciliação, com um anúncio publicado no Jornal do Brasil garantindo que no Carnaval de 1917, na Avenida Rio Branco, seria cantado o "verdadeiro tango 'Pelo Telefone' dos inspirados carnavalescos João da Mata, o imortal Mestre Germano, a nossa velha amiguinha Ciata, o bom Hilário, com arranjo do pianista Sinhô, dedicado ao falecido repórter Mauro", seguindo-se a letra com o nome de "Roceiro", denunciando Donga nas entrelinhas:

Pelo telefone
A minha boa gente
Mandou avisar
Que meu bom arranjo
Era oferecido
Para se cantar

Ai, ai, ai
Leve a mão na consciência,
Meu bem
Ai, ai, ai
Mas porque tanta presença
meu bem?

O que caradura
De dizer nas rodas
Que esse arranjo é teu
E do bom Hilário
E da velha Ciata
Que o Sinhô escreveu

Tomara que tu apanhes
Para não tornar a fazer isso
Escrever o que é dos outros
Sem olhar o compromisso

Não faltaram também os aproveitadores, que na esteira do êxito da gravação de Bahiano correram atrás dos lucros que se imaginava para os autores de "Pelo Telefone". Mauro de Almeida jamais recebeu um tostão de direitos.

A Versão do Povo

No dia 20/10/1916, Aureliano Leal, chefe de polícia do Rio de Janeiro, então Distrito Federal, determinou por escrito aos seus subordinados que informassem "antes pelo telefone" aos infratores, a apreensão do material usado no jogo de azar. Imediatamente o humor carioca captou a comicidade do episódio, que ao lado de outros foi cantado em versos improvisados nas festas de Tia Ciata e registrado rapidamente por Donga em seu nome, na Biblioteca Nacional. É lógico que os versos oficiais eram diferentes daqueles que ridicularizavam o chefe de polícia. Sua versão popular, a que corria na boca das ruas dizia:

Pelo Telefone

O chefe da polícia
Pelo telefone mandou avisar
Que na Carioca
Tem uma roleta para se jogar

Ai, ai, ai
O chefe gosta da roleta ô maninha
Ai, ai, ai
Ninguém mais fica forreta é maninha

Chefe Aureliano, Sinhô, Sinhô
É bom menino, Sinhô, Sinhô
Prá se jogar, Sinhô, Sinhô
De todo o jeito, Sinhô, Sinhô
O bacará, Sinhô, Sinhô
O pinguelim, Sinhô, Sinhô
Tudo é assim


A letra registrada por Donga, que passou a ser conhecida como original e aparece nas gravações até hoje, é alongada, homenageando o Peru, o jornalista Mauro de Almeida, co-autor da obra, e o Morcego, Norberto do Amaral Júnior, conhecido no Clube dos Democráticos. Incorpora também elementos do folclore nordestino:

Pelo Telefone

O chefe da folia
Pelo telefone manda avisar
Que com alegria não se questione
Para se brincar

Ai, ai, ai
Deixa as mágoas para trás ó rapaz!
Ai, ai, ai
Fica triste se és capaz e verás

Tomara que tu apanhes
Pra nunca mais fazer isso
Tirar amores dos outros
E depois fazer feitiço

Ai, a rolinha, Sinhô, Sinhô
Se embaraçou, Sinhô, Sinhô
É que a avezinha, Sinhô, Sinhô
Nunca sambou, Sinhô, Sinhô
Porque esse samba, Sinhô, Sinhô
É de arrepiar, Sinhô, Sinhô
Põe a perna bamba, Sinhô, Sinhô
Me faz gozar, Sinhô, Sinhô

O Peru me disse
Se o Morcego visse
Eu fazer tolice,
Que eu então saísse
Dessa esquisitice
De disse que não disse

Ai, ai, ai
Aí está o canto ideal
Triunfal
Viva o nosso carnaval
Sem rival

Se quem tira o amor dos outros
Por Deus fosse castigado
O mundo estava vazio
E o inferno só habitado

Queres ou não, Sinhô, Sinhô
Vir pro cordão, Sinhô, Sinhô
Do coração, Sinhô, Sinhô
Porque esse samba, Sinhô, Sinhô
É de arrepiar, Sinhô, Sinhô
Põe a perna bamba, Sinhô, Sinhô
Me faz gozar, Sinhô, Sinhô



Pelo Telefone

O Chefe da polícia
Pelo telefone manda me avisar
Que na carioca
Tem uma roleta para se jogar
O Chefe da polícia
Pelo telefone manda me avisar
Que na carioca
Tem uma roleta para se jogar

Ai, ai, ai
Deixe as mágoas pra trás, ó rapaz
Ai, ai, ai
Fica triste se és capaz e verás
Ai, ai, ai
Deixe as mágoas pra trás, ó rapaz
Ai, ai, ai
Fica triste se és capaz e verás

Tomara que tu apanhes
Pra nunca mais fazer isso
Roubar amores dos outros
E depois fazer feitiço

Olha a rolinha, Sinhô, Sinhô
Se embaraçou, Sinhô, Sinhô
Caiu no lago, Sinhô, Sinhô
Do nosso amor, Sinhô, Sinhô
Porque este samba, Sinhô, Sinhô
É de arrepiar, Sinhô, Sinhô
Põe perna bamba, Sinhô, Sinhô
Mas faz gozar, Sinhô, Sinhô

O Peru me disse
Se o Morcego visse
Não fazer tolice,
Que eu não saísse
Dessa esquisitice
Do disse me disse
Mas o Peru me disse
Se o Morcego visse
Não fazer tolice,
Que eu não saísse
Dessa esquisitice
Do disse me disse

Ai, ai, ai
Deixe as mágoas pra trás, ó rapaz
Ai, ai, ai
Fica triste se és capaz e verás
Ai, ai, ai
Deixe as mágoas pra trás, ó rapaz
Ai, ai, ai
Fica triste se és capaz e verás

Queres ou não, Sinhô, Sinhô
Vir pro cordão, Sinhô, Sinhô
Ser folião, Sinhô, Sinhô
De coração, Sinhô, Sinhô
Porque este samba, Sinhô, Sinhô
É de arrepiar, Sinhô, Sinhô
Põe perna bamba, Sinhô, Sinhô
Mas faz gozar, Sinhô, Sinhô


Ai Que Saudades da Amélia

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Ai Que Saudades da Amélia
1942
Ataulfo Alves e Mário Lago

"Aí que saudades da Amélia, aquilo sim é que era mulher!"

A quantidade de sambas imortais que Ataulfo Alves criou é impressionante. O motivo? Ele poderia, quem sabe, responder dizendo o nome de um de seus sambas: "É Um Quê Que a Gente Tem". Pois é, Ataulfo Alves tinha aquele quê, um modo de dizer e sentir as coisas que penetrava direto na alma popular. É certo que nem sempre seus sucessos foram espontâneos e que muitas vezes ele teve que dar uma mãozinha extra para que o samba fosse bem executado nas rádios, mas isso não tira o valor e a grande força comunicativa da sua canção.

Para ilustrar e encurtar a estória, depois de "Ai, Que Saudades da Amélia", o nome de Amélia ganhou novo sentido, o de companheira fiel, que ficava ao lado de seu homem mesmo diante das dificuldades da vida e foi parar no dicionário de Aurélio Buarque de Holanda como "Mulher que aceita toda sorte de privações e/ou vexames sem reclamar, por amor a seu homem". É a canção popular criando um novo sentido para uma palavra.

A música "Ai, Que Saudades da Amélia", teve como inspiração, segundo pesquisadores, um fato real. A história foi contada por pessoas do ciclo de amizade dos dois autores com pequenas alterações nas versões. De forma resumida o fato foi o seguinte:

O baterista Almeidinha, irmão de Aracy de Almeida,  contava em rodas de amigos, no Café Nice, que a cantora Aracy de Almeida, sua irmã, tinha uma lavadeira de dar inveja a qualquer dona de casa. O baterista, ao se referir às mulheres da época, costumava brincar, exaltando os predicados da doméstica. Entre outros comentários, dizia coisas como:

"Amélia era que era mulher. Amélia lavava, passava, cozinhava... Amélia era solidária ao seu homem, e passava fome ao seu lado e achava bonito não ter o que comer... e o dinheiro que ela ganhava o marido bebia... Ai! que saudades da Amélia!"

Hoje a brincadeira seria considerada machista, mas, na época, Mário Lago percebeu que ali dava samba do bom. Escreveu a letra e passou para seu parceiro Ataulfo Alves que alterou, a contragosto do letrista, alguns versos para adaptá-los à melodia.

Brincadeira sem graça, machista, que via a mulher como empregada, obediente, submissa, trabalhadeira... Mas que originou este samba genial. Disse Mário de Andrade:

"Gostei, sim, muitíssimo do 'Amélia', é das coisas mais cariocas que se pode imaginar. (...) Ora, o sujeito estoura naquela bruta saudade da Amélia, só porque está sentindo dificuldade com a nova, você já viu coisa mais humana e misturadamente humana? Tem despeito, tem esperteza, tem desabafo, tristeza, ironia, safadeza de malandro, tem ingenuidade, tem pureza lamacenta: É genial. Acho das manifestações mais complexas que há como psicologia coletiva!"

Em 1942 Ataulfo Alves estava em situação financeira difícil e, depois de oferecer inutilmente um novo samba a vários intérpretes da época. Inexplicavelmente, a dupla não conseguiu quem quisesse gravar o samba e o jeito foi o próprio Ataulfo Alves gravá-lo, embora não se considerasse bom cantor. Resolveu ele mesmo lançar, com o acompanhamento do seu grupo Academia do Samba e a introdução do bandolim de Jacob Bittencourt, o samba "Ai Que Saudades da Amélia", em parceria com Mário Lago.

O resto todo mundo sabe: "Ai, Que Saudades da Amélia" logo virou um imenso sucesso, tornando-se um dos sambas mais conhecidos da história da Música Popular Brasileira. 

Como disse o jornalista Hugo Sukman, "'Amélia' elevaria Ataulfo Alves à condição de um dos maiores artistas da cultura brasileira, um artista que mudou para sempre o sentido da palavra Amélia!".

Um dos elementos que caracteriza os sambas de Ataulfo Alves é que eles estão repletos de ditos populares: "Morre o homem, fica a fama", "Atire a primeira pedra", "Perdão foi feito pra gente pedir",  "Laranja madura, na beira da estrada...", "Eu era feliz e não sabia", "Quem é bom já nasce feito", "Pretensão e água benta, cada um toma o que quer", "Nessa vida tudo passa", e tantos outros.

Para conhecer mais sobre a vida e obra de Ataulfo Alves Mário Lago, conheça o blog Famosos Que Partiram.



Ai Que Saudades da Amélia

Nunca vi fazer tanta exigência
Nem fazer o que você me faz
Você não sabe o que é consciência
Não vê que eu sou um pobre rapaz

Você só pensa em luxo e riqueza
Tudo que você vê você quer
Ai, meu Deus, que saudade da Amélia
Aquilo sim é que era mulher

Às vezes passava fome ao meu lado
E achava bonito não ter o que comer
E quando me via contrariado
Dizia: Meu filho, que se há de fazer?

Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia é que era mulher de verdade
Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia é que era mulher de verdade

Às vezes passava fome ao meu lado
E achava bonito não ter o que comer
E quando me via contrariado
Dizia: Meu filho, que se há de fazer?

Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia é que era mulher de verdade
Amélia não tinha a menor vaidade
Amélia é que era mulher de verdade

Vingança

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Vingança
Lupicínio Rodrigues
1951

"Vingança"é um dos clássicos de Lupicínio Rodrigues, juntamente com "Nunca", inspirados em Mercedes, também conhecida por Dona Carioca.

"Vingança" foi o maior sucesso comercial de Lupicínio Rodrigues. Composta como um desabafo diante da traição de Mercedes, uma de suas muitas namoradas, foi gravada por Linda Batista em 1951 e fez sucesso até no Japão.

Com o dinheiro que ganhou naquele ano, Lupicínio Rodrigues comprou um carro e batizou-o com o mesmo nome da canção.

"Toda vez que uma mulher me trai, eu ganho dinheiro", costumava dizer Lupicínio Rodrigues, afirmando que só escrevia sobre experiências vividas por ele ou por seus amigos. "As mulheres boazinhas nunca me deram dinheiro, só as que me traíram!".

"O Som do Pasquim" (Ed. Desiderata, 2009) é um livro organizado por Tárik de Souza, reunindo algumas antológicas entrevistas que o pessoal do Pasquim, Ziraldo, Jaguar e Henfil, fez com cantores e compositores nos anos 70. Segundo Jaguar, "quando o jornaleco e a MPB estavam no auge, nem a Censura conseguia segurar!".

Uma das entrevistas antológicas foi com Lupicínio Rodrigues, um dos cinco maiores compositores gaúchos de todos os tempos, que contou a história de uma série de suas canções. Lupicínio Rodrigues, pra quem não sabe, foi quem criou a expressão "dor de cotovelo", sendo ainda responsável por classificá-las em dor de cotovelo federal (que só poderia ser curada com embriaguez total),  estadual (suportável, que se ajeitava com o passar do tempo) e  municipal (incapaz até mesmo de inspirar um samba).

Duas das  músicas inspiradas numa "Dor-de-cotovelo Federal" são "Vingança" e "Nunca" , ambas inspiradas numa mesma mulher. Lupicínio Rodrigues contou ao pasquim a história:

Lupicínio: A mulher que me inspirou "Vingança" viveu comigo seis anos. E depois terminou namorando um garoto que era meu empregado, que tinha 16, 17 anos.
Pasquim: Foi passado pra trás por um garoto de 17 anos?
Lupicínio: Não foi bem assim. É que eu tinha viajado, ela mandou chamar o garoto. Disse que queria falar com ele. Ela mandou um bilhete. O garoto com medo de mim, quando eu cheguei, me entregou o bilhete. Disse: "Olha, a Dona Carioca me mandou esse bilhete. Eu não sabia o que ela queria comigo. Não fui!". Entregou a mulher. Aí eu não disse nada, fiquei quietinho, inventei outra viagem, peguei a mala e fui embora.
Pasquim: Endoidou?
Lupicínio: Era época de carnaval, ela endoidou. Botou um "Dominó". Dominó é aquela fantasia preta que cobre tudo. No carnaval, feito louca, foi me procurar. Uma certa madrugada, ela, num fogo danado - parece que deu fome, entrou num bar onde a gente costumava comer. Foi obrigada a tirar o "Dominó" pra comer, e o pessoal a reconheceu. Perguntaram: "Ué, Carioca, que você está fazendo aqui a essa hora? Cadê o Lupi?".
Pasquim: Carioca por quê? Ela é carioca?
Lupicínio: É sim. Ela é viva, mora aqui. Aí ela começou a chorar. Eu estava num restaurante do outro lado. Uns amigos chegaram e me disseram: "Ô, encontramos a Carioca vestida de 'Dominó', num fogo tremendo. Começou a chorar e perguntar por ti. O que houve, vocês estão brigados?". Aí foi que eu fiz "Vingança". Na mesma hora, comecei, saiu (cantando): "Gostei tanto, tanto, quando me contaram..."
Pasquim: Foi uma ruptura pra valer?
Lupicínio: Eu sou muito amigo dos pais de santo, os batuqueiros lá de Porto Alegre. em cada lugar que chegava ela botava fotografia minha, cabritas, aquele negócio todo para fazer as pazes. Aí eu fiz (canta) "Nunca, nem que o mundo caia sobre mim / Nem se deus mandar nem mesmo assim."
Pasquim: O que essa mulher contribuiu para a Música Popular Brasileira não foi normal.

Quem ouve "Vingança" e "Nunca" percebe o quanto são canções amargas, de mágoa e desamor.

"Vingança" relata justamente um prazer pelo sofrimento do ser outrora amado, mas que não cede à vergonha, que na verdade é o orgulho, o sentimento da honra decorrente de uma traição. E por isso luta internamente, dizendo que, enquanto força houver no peito, o eu-lírico quer apenas vingar-se e querer o mal de quem lhe traíra.

Para conhecer mais sobre a vida e obra de Lupicínio Rodrigues, visite o blog Famosos Que Partiram.



Vingança

Eu gostei tanto,
tanto, quando me contaram.
Que lhe encontraram
bebendo e chorando
na mesa de um bar.

E que quando os amigos do peito
por mim perguntaram.
Um soluço cortou sua voz,
não lhe deixou falar.

Eu gostei tanto,
tanto, quando me contaram.
Que tive mesmo de fazer esforço
pra ninguém notar.

O remorso talvez seja a causa
do seu desespero.
Você deve estar bem consciente
do que praticou.

Me fazer passar tanta vergonha
com um companheiro.
E a vergonha
é a herança maior que meu pai me deixou.

Mas enquanto houver força em meu peito
eu não quero mais nada.
Só vingança, vingança, vingança
aos santos clamar.

Você há de rolar como as pedras
que rolam na estrada.
Sem ter nunca um cantinho de seu
pra poder descansar.

Mas enquanto houver força em meu peito
eu não quero mais nada.
Só vingança, vingança, vingança
aos santos clamar.

Você há de rolar como as pedras
que rolam na estrada.
Sem ter nunca um cantinho de seu
pra poder descansar.

Nunca

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Nunca
Lupicínio Rodrigues
1952

"Nunca"é um dos clássicos de Lupicínio Rodrigues, juntamente com "Vingança", inspirados em Mercedes, também conhecida por Dona Carioca.

"Toda vez que uma mulher me trai, eu ganho dinheiro", costumava dizer Lupicínio Rodrigues, afirmando que só escrevia sobre experiências vividas por ele ou por seus amigos. "As mulheres boazinhas nunca me deram dinheiro, só as que me traíram!".

"O Som do Pasquim" (Ed. Desiderata, 2009) é um livro organizado por Tárik de Souza, reunindo algumas antológicas entrevistas que o pessoal do Pasquim, Ziraldo, Jaguar e Henfil, fez com cantores e compositores nos anos 70. Segundo Jaguar, "quando o jornaleco e a MPB estavam no auge, nem a Censura conseguia segurar!".

Uma das entrevistas antológicas foi com Lupicínio Rodrigues, um dos cinco maiores compositores gaúchos de todos os tempos, que contou a história de uma série de suas canções. Lupicínio Rodrigues, pra quem não sabe, foi quem criou a expressão "dor de cotovelo", sendo ainda responsável por classificá-las em dor de cotovelo federal (que só poderia ser curada com embriaguez total),  estadual (suportável, que se ajeitava com o passar do tempo) e  municipal (incapaz até mesmo de inspirar um samba).

Duas das  músicas inspiradas numa "Dor-de-cotovelo Federal" são "Nunca" e "Vingança" , ambas inspiradas numa mesma mulher. Lupicínio Rodrigues contou ao pasquim a história:

Lupicínio: A mulher que me inspirou "Vingança" viveu comigo seis anos. E depois terminou namorando um garoto que era meu empregado, que tinha 16, 17 anos.
Pasquim: Foi passado pra trás por um garoto de 17 anos?
Lupicínio: Não foi bem assim. É que eu tinha viajado, ela mandou chamar o garoto. Disse que queria falar com ele. Ela mandou um bilhete. O garoto com medo de mim, quando eu cheguei, me entregou o bilhete. Disse: "Olha, a Dona Carioca me mandou esse bilhete. Eu não sabia o que ela queria comigo. Não fui!". Entregou a mulher. Aí eu não disse nada, fiquei quietinho, inventei outra viagem, peguei a mala e fui embora.
Pasquim: Endoidou?
Lupicínio: Era época de carnaval, ela endoidou. Botou um "Dominó". Dominó é aquela fantasia preta que cobre tudo. No carnaval, feito louca, foi me procurar. Uma certa madrugada, ela, num fogo danado - parece que deu fome, entrou num bar onde a gente costumava comer. Foi obrigada a tirar o "Dominó" pra comer, e o pessoal a reconheceu. Perguntaram: "Ué, Carioca, que você está fazendo aqui a essa hora? Cadê o Lupi?".
Pasquim: Carioca por quê? Ela é carioca?
Lupicínio: É sim. Ela é viva, mora aqui. Aí ela começou a chorar. Eu estava num restaurante do outro lado. Uns amigos chegaram e me disseram: "Ô, encontramos a Carioca vestida de 'Dominó', num fogo tremendo. Começou a chorar e perguntar por ti. O que houve, vocês estão brigados?". Aí foi que eu fiz "Vingança". Na mesma hora, comecei, saiu (cantando): "Gostei tanto, tanto, quando me contaram..."
Pasquim: Foi uma ruptura pra valer?
Lupicínio: Eu sou muito amigo dos pais de santo, os batuqueiros lá de Porto Alegre. em cada lugar que chegava ela botava fotografia minha, cabritas, aquele negócio todo para fazer as pazes. Aí eu fiz (canta) "Nunca, nem que o mundo caia sobre mim / Nem se deus mandar nem mesmo assim."
Pasquim: O que essa mulher contribuiu para a Música Popular Brasileira não foi normal.

Quem ouve "Nunca" e "Vingança" percebe o quanto são canções amargas, de mágoa e desamor.

"Nunca" relata aquele que sofreu por amor e se recusa a perdoar, pois a perda da ilusão faz sepultar o coração... mas ao final recorre à saudade, como mensageira de um amor que o eu-lírico insiste em dizer que é passado (como foi sincero o meu amor / como eu a adorei, tempos atrás) mas que se confessa presente no final.

Para conhecer mais sobre a vida e obra de Lupicínio Rodrigues, visite o blog Famosos Que Partiram.



Nunca

Nunca!
Nem que o mundo caia sobre mim,
Nem se Deus mandar,
Nem mesmo assim,
As pazes contigo eu farei.

Nunca!
Quando a gente perde a ilusão,
Deve sepultar o coração,
Como eu sepultei.

Saudade,
Diga a esse moço, por favor,
Como foi sincero o meu amor,
Quanto eu te adorei
Tempos atrás.

Saudade,
Não se esqueça também de dizer
Que é você quem me faz adormecer
Pra que eu viva em paz.


Sonhos

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Sonhos
Peninha
1977

A história da gravação da música "Sonhos", sucesso do cantor e compositor Peninha, começou nos estúdios da Polygram, atualmente Universal, na Rua Érico Veríssimo no Rio de Janeiro.

O produtor Pedrinho da Luz já estava com o disco do artista pronto, com arranjos do maestro Miguel Cidras. Subitamente Pedrinho da Luz entrou no Estúdio B, aonde estava gravando Zizi Possi, e chamou o maestro Hugo Bellard, um arranjador de vários sucessos.

Pedrinho da Luz pediu ao Hugo Bellard que com urgência fizesse o arranjo, em duas horas, da música "Sonhos", para aproveitar o restante do horário de estúdio que tinha reservado para o Peninha.

Como Hugo Bellard dissesse que não poderia sair dali porque estava no meio da gravação da Zizi PossiPedrinho da Luz pediu à produção que liberasse o Hugo Bellard.

O maestro ouviu a música, tirou os acordes, e se baseou na música "This Masquerade" que fazia sucesso nos Estados Unidos com George Benson, para o arranjo. Na segunda parte deu uma pitada de Beatles, como os cellos no estilo da música "Eleanor Rigby".

Foi o único arranjo de Hugo Bellard no disco, mas foi a música que fez sucesso, vendendo mais de 600.000 discos em semanas, um grande feito para a época. A musica até hoje vendeu mais de 1 milhão de cópias.

"Sonhos" serviu para lançar a carreira deste talentoso compositor Peninha, que hoje tem dezenas de grandes sucessos gravados pelos mais variados intérpretes.

Caetano Veloso gostou da música e do arranjo, e regravou a música em 2001. E "Sonhos" foi novamente ao primeiro lugar nas paradas.



Sonhos

Tudo era apenas uma brincadeira
E foi crescendo, crescendo, me absorvendo
E de repente, eu me vi assim, completamente seu

Vi a minha força amarrada no seu passo
Vi que sem você não tem caminho, eu não me acho
Vi um grande amor gritar dentro de mim
Como eu sonhei um dia

Quando o meu mundo era mais mundo
E todo mundo admitia
Uma mudança muito estranha
Mais pureza, mais carinho
Mais calma, mais alegria no meu jeito de me dar

Quando a canção se fez mais forte e mais sentida
Quando a poesia fez folia em minha vida
Você veio me contar dessa paixão inesperada por outra pessoa

Mas não tem revolta, não
Eu só quero que você se encontre
Ter saudade até que é bom
É melhor que caminhar vazio
A esperança é um dom que eu tenho em mim
Eu tenho, sim

Não tem desespero, não
Você me ensinou milhões de coisas
Tenho um sonho em minhas mãos
Amanhã será um novo dia
Certamente eu vou ser mais feliz

Domingo no Parque

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Domingo no Parque
Gilberto Gil
1967

"Domingo no Parque"é uma canção de Gilberto Gil, lançada em 1967. Trata-se de uma música narrativa, que conta a história de dois rapazes amigos: um deles é José, o rei da brincadeira, e o outro João, o rei da confusão.

No fim de semana, ambos foram fazer o que sabiam: divertir-se e brigar, respectivamente.

Mas José não ia brigar, quando viu uma moça - Juliana - no parque de diversões e se apaixona, mas é tomado de raiva quando vê Juliana com João, sendo tomado pelo ciúme e cometendo um duplo homicídio passional, levando ao anticlímax final.

A música é riquíssima em figuras de linguagem, como as metonímias, anáforas e quiasmos. Nos arranjos, a composição causou violenta polêmica por unir elementos considerados contraditórios da cultura contemporânea, como o som do berimbau, o andamento melódico da letra, que lembra um baião, de um lado, e, de outro, a presença de orquestra de música erudita e o acompanhamento de um conjunto de rock, no caso Os Mutantes, o que revoltou muitos fãs tradicionalistas de música brasileira, por causa do uso de guitarra elétrica, considerado então um símbolo do "colonialismo cultural".


Gilberto Gil ganhou o segundo lugar com essa canção no III Festival de Música Popular da TV Record de 1967, acompanhado do grupo Os Mutantes, com moderno arranjo de Rogério Duprat, também premiado em primeiro lugar nesse quesito.

A música foi lançada no álbum "Gilberto Gil" (1968) e teve o mérito de, ao lado de "Alegria, Alegria", de Caetano Veloso, se tornar um divisor na música brasileira. Gilberto Gil buscava um som mais universal para a música que se fazia naquela época e usou elementos baianos, como o som do berimbau e a roda de capoeira. A história de José e João tem narrativa cinematográfica e o arranjo orquestral de Rogério Duprat pontua o confronto e descreve perfeitamente esse clima de delírio.



Domingo no Parque

O rei da brincadeira - ê, José!
O rei da confusão - ê, João!
Um trabalhava na feira - ê, José!
Outro na construção - ê, João!

A semana passada, no fim da semana
João resolveu não brigar
No domingo de tarde saiu apressado
E não foi pra Ribeira jogar
Capoeira
Não foi pra lá pra Ribeira
Foi namorar

O José como sempre no fim da semana
Guardou a barraca e sumiu
Foi fazer no domingo um passeio no parque
Lá perto da Boca do Rio
Foi no parque que ele avistou
Juliana
Foi que ele viu

Foi que ele viu
Juliana na roda com João
Uma rosa e um sorvete na mão
Juliana, seu sonho, uma ilusão
Juliana e o amigo João
O espinho da rosa feriu Zé
E o sorvete gelou seu coração

O sorvete e a rosa - ô, José
A rosa e o sorvete - ô, José
Oi, dançando no peito - ô, José
Do José brincalhão - ô, José

O sorvete e a rosa - ô, José
A rosa e o sorvete - ô, José
Oi, girando na mente - ô, José
Do José brincalhão - ô, José

Juliana girando - oi, girando
Oi, na roda gigante - oi, girando
Oi, na roda gigante - oi, girando
O amigo João - João

O sorvete é morango - é vermelho
Oi, girando, e a rosa - é vermelha
Oi, girando, girando - é vermelha
Oi, girando, girando - olha a faca!

Olha o sangue na mão - ê, José
Juliana no chão - ê, José
Outro corpo caído - ê, José
Seu amigo, João - ê, José

Amanhã não tem feira - ê, José
Não tem mais construção - ê, João
Não tem mais brincadeira - ê, José
Não tem mais confusão - ê, João

Tristeza do Jeca

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Tristeza do Jeca
Angelino de Oliveira
1918

Muito antes de empresários inescrupulosos associarem o termo "Sertanejo" ao "Universitário", para denominar um dos mais vergonhosos embustes já surgidos na história da música brasileira, duplas como Pedro Bento & Zé da Estrada, Tião Carreiro& Pardinho, Milionário & José Rico, Tibagi & Miltinho lançavam mão da viola para cantar as agruras e alegrias do campônio brasileiro.

A música que faziam denotava a legítima riqueza cultural do interior do País, muitas vezes injustamente ignorada pela população urbana. Assim, composições como "Chico Mineiro", "Chalana", "Cabocla Tereza", "Saudade da Minha Terra", "Mula Preta", "Moda da Pinga", "Rio de Lágrimas", "Preto de Alma Branca", "Canarinho do Peito Amarelo" "O Menino da Porteira", tornaram-se clássicos absolutos da música sertaneja nacional.

Mas o clássico dos clássicos da música caipira pertence a Angelino Oliveira, que compôs "Tristeza do Jeca", sob a inspiração do famoso personagem Jeca Tatu, criado por Monteiro Lobato no seu romance "Urupês".

"Tristeza do Jeca"é, assim, um dos mais fidedignos retratos do sertanejo brasileiro, ainda mais quando escutada na interpretação inconfundível daquela que foi a maior dupla sertaneja de todos os tempos: Tonico& Tinoco.

"Tristeza do Jeca", o verdadeiro Hino do Caipira, foi composta em 1918, editada 1922 e gravada pela primeira vez, só que na forma instrumental, em 1925. A primeira gravação cantada foi em 1926 na voz de Patrício Teixeira. Mas a primeira gravação que realmente tornou célebre "Tristezas do Jeca" ficou a cargo do cantor Paraguassu, Roque Ricciardi, em 1937 pela Gravadora Colúmbia.

"Tristeza do Jeca" também foi gravada por grandes duplas como Tonico & Tinoco, Inezita Barroso, Pena Branca & Xavantinho, Sérgio Reis, Passoca, Zico & Zeca, Irmãs Galvão e entre outros tantos. Esta composição atravessou fronteiras e serviu muitas vezes como fundo musical ao se falar sobre o Brasil no exterior.


Mazzaropi também empregou "Tristeza do Jeca" no filme homônimo em 1961, ocasião na qual chegou a ter uma pequena desavença com Angelino de Oliveira quanto aos direitos autorais, mas que foi rapidamente resolvida num encontro entre Mazzaropi e Angelino.

Também foi um espetáculo inesquecível a estréia da toada "Tristeza do Jeca", a qual se deu no Clube 24 de Maio em Botucatu, SP, em 1918. Marília Banducci e Aurélia Gouveia cantaram a belíssima melodia acompanhadas pelo próprio Angelino de Oliveira no violão. Após um curto silêncio que sucedeu o último acorde, iniciou-se um aplauso que, de início tímido, prolongou-se, seguido então de pedidos de bis e, segundo depoimentos, a música foi apresentada cinco vezes naquela noite. E, Ariowaldo Pires, o Capitão Furtado, que na época tinha 11 anos de idade, presenciou esse momento maravilhoso, pois seu pai era zelador do Clube 24 de Maio.

Curiosamente, "Tristeza do Jeca" não era a música preferida de Angelino de Oliveira. Ele mesmo se espantava com o sucesso de sua composição. Inclusive, às vezes, se esquecia de parte da letra quando as pessoas insistiam para que ele a tocasse, principalmente no Colosso, que era o bar preferido onde Angelino de Oliveira gostava de fazer seus encontros musicais com os diversos amigos, tendo sempre presente o José Maria Peres.

"Tristeza do Jeca" chegou a ser utilizada como prefixo pela BBC de Londres quando a mesma iniciava suas transmissões para o Brasil.

O sucesso de "Tristeza do Jeca" em interpretações consagradas como as de Tonico & Tinoco Inezita Barroso nos faz classificar Angelino de Oliveira como um compositor de música caipira, o que não é verdade, pois Angelino também compôs muitas serestas e canções.

Quanto à música caipira, na época, o progresso da mesma já intrigava Angelino de Oliveira que implicava com os rumos que ela vinha tomando, principalmente quando se tratava dos dramas sertanejos que já faziam sucesso. Dizia Angelino de Oliveira:

"Gozada a moda desses caipiras, só fala em desgraça. O pequenininho tá chorando, a mãe vem e derrama um caldeirão de água quente na criança, aí o marido chega em casa, mata tudo e depois se suicida... é desgraça multiplicada por dez! Ah, larga a mão, parece que a música pra ser boa tem que ter desgraça dobrada!?"

O Filme

"Tristeza do Jeca"é um filme brasileiro de 1961 produzido e dirigido por Amácio Mazzaropi, o 13º de sua carreira e seu primeiro a cores. As filmagens foram nos estúdios da Companhia Cinematográfica Vera Cruz. Números musicais com o próprio Mazzaropi e Agnaldo Rayol.

Sinopse: Jeca, a esposa Filó, e os filhos Maria e Toninho, são trabalhadores da fazenda do Coronel Felinto, que disputa a eleição para prefeito. Seu opositor, o idoso Coronel Policarpo, é apoiado pelo Coronel Bonifácio. Ambos os candidatos querem o apoio de Jeca que é tido como um dos líderes dos trabalhadores. Jeca não quer se envolver na disputa, mas quando Sérgio, filho de Bonifácio, pede em casamento sua filha Maria, ele acaba deixando se influenciar e todos pensam que ele apoia Policarpo. O Coronel Felinto não aceita e ameaça a todos de expulsão da fazenda e rapta o filho Toninho, tentando forçar Jeca e seus amigos a votarem nele.



Tristeza do Jeca

Nestes versos tão singelo
Minha bela, meu amor
Pra você quero contar
O meu sofrer e a minha dor
Eu sou que nem sabiá
Quando canta é só tristeza
Desde um galho onde ele está

Nesta viola eu canto e gemo de verdade
Cada toada representa uma saudade

Eu nasci naquela serra
Num ranchinho beira-chão
Todo cheio de buraco
Onde a lua faz clarão
Quando chega a madrugada
Lá na mata a passarada
Principia um barulhão

Nesta viola eu canto e gemo de verdade
Cada toada representa uma saudade

Vou parar com a minha viola
Já não posso mais cantar
Pois um jeca quando canta
Têm vontade de chorar
O choro que vai caindo
Devagar vai-se sumindo
Como as água vão pro mar


Traduzir-se

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Traduzir-se
Poema de Ferreira Gullar
Música de Fagner
1981

"Traduzir-se"é um poema de Ferreira Gullar publicado em 1980, no livro "Na Vertigem do Dia". O poema foi musicado por Raimundo Fagner em 1981.

Embora tenha colocado, com rara beleza, a letra no clássico "Trenzinho do Caipira", de Villa LobosFerreira Gullar declarou não ter muita habilidade para colocar letra em música já pronta, o inverso, no entanto, é verdadeiro: a poesia de Ferreira Gullaré extremamente musical, muitas até parecem que foram feitas especialmente para serem musicadas.

O próprio Fagner, um amigo e admirador da obra de Ferreira Gullar, trabalhou, pelo menos, mais quatro poemas de seus poemas. São eles: "Contigo", "Cantiga Para Não Morrer (Me Leve)", "Menos a Mim" e "Rainha da Vida". Raimundo Fagner certamente não acredita na incapacidade do poeta em colocar letra em música pronta, certa vez, o cantor encaminhou um CD com várias músicas para que Ferreira Gullar colocasse a letra, e sobre este assunto Ferreira Gullar declarou:

"O caso do Fagner é diferente, ele me procurou, ele buscou meus poemas e nos tornamos amigos. Eu gosto muito dele, tenho uma grande amizade por esse cearense. De vez em quando ele me liga ou me escreve, até me pediu outro dia para que eu colocasse letras numas músicas que ele enviou num CD - por problemas técnicos a mídia não funcionou, ficando eu impossibilitado de ouvir as músicas."

Infelizmente não conseguimos saber os desdobramentos, o certo é que Ferreira Gullar ainda presenteou Fagner com várias traduções e versões de músicas estrangeiras, entre elas, a popular "Borbulha de Amor" (Borbujas de Amor) do dominicano Juan Luis Guerra.



Traduzir-se

Uma parte de mim é todo mundo
Outra parte é ninguém, fundo sem fundo

Uma parte de mim é multidão
Outra parte estranheza e solidão

Uma parte de mim pesa e pondera
Outra parte delira

Uma parte de mim almoça e janta
Outra parte se espanta

Uma parte de mim é permanente
Outra parte se sabe de repente

Uma parte de mim é só vertigem
Outra parte linguagem

Traduzir uma parte na outra parte
Que é uma questão de vida e morte
Será arte? Será arte?...

Uma parte de mim é permanente
Outra parte se sabe de repente

Uma parte de mim é só vertigem
Outra parte linguagem

Traduzir uma parte na outra parte
Que é uma questão de vida e morte
Será arte? Será arte?...


Fonte: Dr. Zem

Das Duzentas Pra Lá

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Das Duzentas Pra Lá
João Nogueira
1972

No início da década de 70, o governo de Emílio Garrastazu Médici assinou um decreto estendendo para 200 milhas o limite do mar territorial brasileiro. Comemorando a medida, em 1972 João Nogueira faria letra e música de "Das Duzentas Pra Lá", que festejava:

Esse mar é meu
leva seu barco pra lá desse mar
tem rede verde-e-amarela
no azul desse mar

Em seu livro, Paulo Cesar de Araújo classifica a música como uma canção adesista:

"Algumas pessoas podem não enxergar assim, só porque foi o João Nogueira, um cara do samba, da raiz, da Música Popular Brasileira, quem gravou a música. Mas me pareceu uma patriotada dele. Se por exemplo os seus autores fossem Dom & Ravel, "Das Duzentas Pra Lá" seria adjetivada de ufanista e eles seriam crucificados."

O aumento da faixa de mar territorial foi bem-recebido por praticamente todos os setores da sociedade brasileira, o que, segundo Paulo Cesar de Araújo, reflete o clima ufanista daqueles tempos. João Nogueira, que morreu em 2000, foi figura atuante no processo de redemocratização do país, participando a partir da década de 80 de campanhas de partidos progressistas, como o Partido Democrático Trabalhista (PDT) de Leonel Brizola.

Se a música sertaneja de José Mendes apoiava o decreto presidencial de "peitar" os Estados Unidos "na marra", o samba de João Nogueira também dava o seu aval.

A música "Das Duzentas Pra Lá" foi gravada por Eliana Pittman e chegou aos primeiros lugares das paradas de sucesso.

Nas palavras do próprio  João Nogueira:

Mesmo depois que comecei a gravar, eu compunha e dava a músicas para cantores. O cantor me pedia música e eu dava música pra ele.
Aí nessa mesma ocasião eu dei uma música para a Eliana Pittman que fez um grande sucesso. Fez até sucesso internacional. Era uma música que falava da plataforma continental, das duzentas milhas marítimas que o Governo brasileiro tinha implantado.
Até chegaram a me confundir com a turma que fazia música para a Revolução. Mas não era nada disso não porque depois que essa música fez um grande sucesso... isso aí saiu na revista Time... meu samba saiu na revista Time e eu trabalhando na Caixa Econômica. Dizia o seguinte:
Quando o embaixador americano veio ao Brasil para tentar diminuir a extensão da plataforma marítima, o embaixador brasileiro disse o seguinte: Agora já não há mais tempo porque todo o povo brasileiro já canta um samba que diz: "Vá jogar a sua rede das duzentas para lá. Pescador dos olhos verdes vá pescar noutro lugar!"
(João Nogueira - TV Cultura, Programa Ensaio)


Das Duzentas Pra Lá

Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá desse mar
Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá

Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá desse mar
Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá

Vá jogar a sua rede das duzentas para lá
Pescador dos olhos verdes
Vá pescar em outro lugar

Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá desse mar
Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá

Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá desse mar
Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá

E o barquinho vai
Com nome de caboclinha
Vai puxando a sua rede
Da vontade de cantar
Tem rede amarela e verde
No verde azul desse mar

Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá desse mar
Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá

Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá desse mar
Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá

Obrigado seu Doutor pelo acontecimento
Vai ter peixe, camarão
Lagosta que só Deus dá
Pegou bem a sua idéia
Peixe é bom pro pensamento
E a partir desse momento
Meu povo vai pensar

Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá desse mar
Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá

Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá desse mar
Esse mar é meu
Leva seu barco pra lá

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