Chão de Giz
Zé Ramalho
1973
"Essa música foi feita para o amor que senti por uma mulher casada. Eu era garotão, ela era uma mulher de um industrial e muito rica. Ela me dava uns flertes, e isso me inspirou essa música. Eu tinha mais ou menos vinte anos. Inocente, burro e besta como dizia Raul Seixas."
"Chão de Giz"é uma famosa canção do cantor brasileiro Zé Ramalho, composta em 1973 e gravada em 1978 em seu álbum de estreia solo "Zé Ramalho".
Segundo dados divulgados pelo Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD), que abrangeu o período de 2010 a 2014, essa foi a música mais tocada do artista neste período, e a 4ª entre as obras mais regravadas. Além disso, ela aparece na 10ª posição entre as "músicas mais tocadas ao vivo" no ano de 2014, segundo dados do mesmo órgão.
E você já parou alguma vez na vida para tentar entender esta música tão complexa? Zé Ramalho consegue ser um dos poucos cantores que compõe músicas com alto repertório (de difícil entendimento) e mesmo assim agrada o gosto popular. Consegue transmitir sentimentos.
A explicação dada, em tese, pelo próprio compositor Zé Ramalho sobre "Chão de Giz" é que, ainda jovem, ele teve um caso duradouro com uma mulher bem mais velha, casada com uma pessoa bem influente da sociedade de João Pessoa, na Paraíba, onde morava. Ambos se conheceram no carnaval. Zé Ramalho ficou perdidamente apaixonado por esta mulher, que jamais abandonaria um casamento para ficar com um "garoto pé-rapado". Ela apenas "usava-o". Assim, o caso que tomava proporções enormes foi terminado. Zé Ramalho ficou arrasado por meses, mudou de casa, pois morava perto da mulher e, nesse meio tempo, compôs "Chão de Giz".
Sabendo deste pequeno resumo da história, fica mais fácil interpretar cada verso da canção:
"Eu desço desta solidão e espalho coisas sobre um chão de giz"
Um dos hábitos de Zé Ramalho, no sofrimento, era espalhar pelo chão todas as coisas que lembravam o caso dos dois. O chão de giz indica como o relacionamento era fugaz.
"Há meros devaneios tolos, a me torturar"
Devaneios e lembranças da mulher que não o amou. O tinha como amante, apenas para realizar suas fantasias. Quando e como queria.
"Fotografias recortadas de jornais de folhas amiúdes"
Outro hábito de Zé Ramalho era recortar e admirar todas as fotos dela que saiam nos jornais - lembrem-se, ela era da alta sociedade, sempre estava nas colunas sociais.
"Eu vou te jogar num pano de guardar confetes"
Pano de guardar confetes são balaios ou sacos típicos das costureiras do Nordeste, nos quais elas jogam restos de pano, papel, etc. Aqui, Zé Ramalho diz que vai jogar as fotos dela nesse tipo de saco e, assim, esquecê-la de vez.
"Disparo balas de canhão, é inútil, pois existe um grão-vizir"
Ele tenta ficar com ela de todas as formas, mas é inútil, pois ela é casada com um homem muito rico.
"Há tantas violetas velhas sem um colibri"
Aqui ele utiliza de uma metáfora. Há tantas violetas velhas (como ela, bela, mas velha) sem um colibri (um jovem que a admire). Dessa forma ele tenta novamente convencê-la apelando para a sorte - mesmo sendo velha (violeta velha), ela pode, se quiser, ter um colibri (jovem).
"Queria usar, quem sabe, uma camisa de força ou de vênus"
Este verso mostra a dualidade do sentimento de Zé Ramalho. Ao mesmo tempo que quer usar uma camisa de força para se afastar dela, ele também quer usar uma camisa de vênus para fazer amor com ela.
"Mas não vou gozar de nós apenas um cigarro"
Novamente ele invoca a fugacidade do amor dela por ele, que o queria apenas para "gozar o tempo de um cigarro". Percebe-se o tempo todo que ele sente por ela um profundo amor e tesão, enquanto é correspondido apenas com o tesão, com o gozo que dura o tempo de se fumar um cigarro.
"Nem vou lhe beijar, gastando assim o meu batom"
Para quê beijá-la, se ela quer apenas o sexo?
"Agora pego um caminhão, na lona vou a nocaute outra vez…"
Novamente ele resolve ir embora, após constatar que é impossível tentar algo sério com ela. Entretanto, apaixonado como está, vai novamente à lona - expressão que significa ir a nocaute no boxe, mas também significa a lona do caminhão, com o qual ele foi embora - ele teve que sair de casa para se livrar desse amor doentio.
"Pra sempre fui acorrentado no seu calcanhar"
Amor inesquecível, que acorrenta. Ela pisava nele e ele cada vez mais apaixonado. Tinha esperanças de um dia ser correspondido.
"Meus vinte anos de boy that’s over, baby! Freud explica"
Ele era bem mais novo que ela. Ele era um boy, ela era uma dama da sociedade. Freud explica um amor desse (Complexo de Édipo, talvez?).
"Não vou me sujar fumando apenas um cigarro"
Depois de muito sofrimento e consciente que ela nunca largaria o marido/status para ficar com ele, ele decide esquecê-la. Essa parte ele diz que não vai se sujar transando mais uma vez com ela, pois agora tem consciência de que nunca passará disso.
"Quanto ao pano dos confetes, já passou meu carnaval"
Eles se conheceram em um carnaval. Voltando a falar das fotos dela, que iria jogar em um pano de guardar confetes, ele consolida o fim, dizendo que já passou seu carnaval (fantasia), passou o momento.
"E isso explica porque o sexo é assunto popular"
Aqui ele faz um arremate do que parece ter sido apenas o que restou do amor dele por ela (ou dela por ele): Sexo. Por isso o sexo é tão popular, pois apenas ele é valorizado. Ela só queria sexo e nada mais.
"No mais, estou indo embora"
Assim encerra-se a canção. É a despedida de Zé Ramalho, mostrando que a fuga é o melhor caminho e uma decisão madura. Ele muda de cidade e nunca mais a vê. Sofreu por meses, enquanto compôs a música.
Chão de Giz
Eu desço dessa solidão
espalho coisas sobre um chão de giz.
Há meros devaneios tolos
a me torturar.
Fotografias recortadas em jornais de folhas
Amiúde!
Eu vou te jogar
num pano de guardar confetes.
Eu vou te jogar
num pano de guardar confetes.
Disparo balas de canhão
é inútil, pois existe um grão-vizir.
Há tantas violetas velhas
sem um colibri.
Queria usar, quem sabe
uma camisa de força ou de vênus.
Mas não vou gozar de nós
apenas um cigarro.
Nem vou lhe beijar
gastando assim o meu batom.
Agora pego um caminhão na lona
vou a nocaute outra vez.
Pra sempre fui acorrentado
no seu calcanhar.
Meus vinte anos de boy
that's over, baby!
Freud explica.
Não vou me sujar
fumando apenas um cigarro.
Nem vou lhe beijar
gastando assim o meu batom.
Quanto ao pano dos confetes
já passou meu carnaval.
E isso explica porque o sexo
é assunto popular.
No mais estou indo embora!
No mais estou indo embora!
No mais estou indo embora!
No mais!